O Irão agiu com medida e prudência para não desencadear o alastramento da guerra no Médio-Oriente, na sua retaliação, face ao crime de guerra israelita de bombardear instalações consulares iranianas em Damasco. Mas, ao mesmo tempo, deixou uma mensagem muito clara aos sionistas e a todos os inimigos que se atrevam a agredi-lo: - O Irão tem meios para causar muito mais danos do que causou agora. Somente danificou pistas de duas bases militares aéreas israelitas, mas tem capacidade técnica para atingir outros alvos, muito mais importantes, em Israel. Não foi uma vingança, efetuarem este ataque de aviso; os iranianos colocam-se num plano de superioridade militar e moral, face aos israelitas. https://www.moonofalabama.org/2024/04/iranian-missiles-hit-israel.html#more

domingo, 31 de julho de 2016

[NO PAÍS DOS SONHOS] CARLOS SEIXAS AOS QUATORZE ANOS




Deslocava-me por vielas esconsas e desertas, não sabendo muito bem em que sítio me encontrava, se nos velhos bairros de Lisboa, se nos de Setúbal ou mesmo de Coimbra. 
Eis senão quando encontro um frade, com o seu hábito de burel e o rosto totalmente na sombra do capuz. 
Perguntei-lhe, naturalmente, onde me encontrava. Ele olhou para mim e, espantado, disse-me: 

- «Está na presença de José António de Seixas»  

Retirou o capuz, deixando ver um rosto trigueiro, quase infantil na sua extrema juventude. 
Mal me recompus do choque, pegou-me gentilmente pela mão e disse-me em voz sussurrada: 

- «Quer ver um espetáculo único, exclusivo e delicioso?»

Não sabia o que responder, então apertei-lhe a mão, em sinal de assentimento... Mais perdido do que já estava, era realmente difícil, naqueles tempos...

Arrastou-me o jovem Seixas ao portal de uma casa apalaçada de imponente fachada. Logo dois criados em libré abriram as pesadas portas de madeiro, para deixar-nos passar. O músico era, com certeza, esperado. 
Este, sempre braço-dado comigo, subiu a majestática escadaria, iluminada por tochas, sustentadas por estátuas de escravos negros profusamente policromadas. 
- Mas onde me encontrava eu, agora? Não sabia. Continuava a não ter a mínima ideia, embora já tivesse percebido que se tratava de Lisboa... Mas de uma Lisboa do início do século XVIII. 

Nisto, o jovem que aqui me trouxera abriu uma porta de duplo batente, com brasões e relevos em talha dourada, revelando um salão onde várias damas e senhores, sentados, conversavam e pigarreavam rapé. 
Assim que viram o jovem, aplaudiram-no efusivamente, dando vivas e palavras simpáticas de encorajamento. 
Este fez uma vénia galante, apesar de ser um jovem frade. 

Sem demoras, pôs-se ao cravo, um instrumento de um só teclado. Ele tangia o singelo instrumento, como se acariciasse o dorso de um belo animal; tirava dele sons subtis ou arrojados, com a maior naturalidade, como quem conversa. 
Ele improvisava como se as teclas e cordas fossem os seus próprios instrumentos fonadores, ou seja, cantava com os dedos.

Após cerca de meia hora parou a exibição virtuosistica do jovem e  um senhor muito bem arranjado e empoado - provavelmente o dono da casa - apresentou aos presentes um nobre cavaleiro, de porte majestático, austero:

- «Il Signore Domenico Scarlatti»

Este fez uma breve reverência dirigindo-se sem hesitação ao fradinho que se erguera entretanto e o olhava com um misto de adoração e de terror.

- «Não temas, Caro...cuidarei que tu faças parte da Capela de sua Alteza el Rei Dom João. Ainda ontem, ele me pediu se eu conhecia em Napoli um bom e talentoso organista... Eu repliquei: Pois tem Vossa Majestade quem muito bem o sirva no Seu próprio Reino». 


Não recordo mais nada desta memorável cena. Talvez eles tenham jogado uma partida de cartas, bebendo um vinho do Porto e cavaqueando, até muito tarde.

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