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sábado, 7 de março de 2020

[António Garcia Pereira] TAP: SAQUEADORES À SOLTA


Publico este texto de Garcia Pereira, conhecido advogado e dirigente de um partido de esquerda. Recebi o texto de «Grazia Tanta» ao qual agradeço o envio. 
Neste «Portugal dos pequeninos», costuma dizer-se que «a culpa morre solteira». Estou em desacordo com o autor do texto abaixo somente num ponto: quando ele conjura a História para fazer justiça *. Efectivamente, a «justiça» da História é a justiça que nunca chega em tempo útil de ressarcir as vítimas e condenar os culpados, porque quando ela profere a sua sentença, já morreram uns e outros, ou pelo menos estão de malas aviadas.... 

(*«A História julgará decerto todos os executantes e beneficiários deste autêntico “golpe do baú” e, mais até do que eles, os governantes e dirigentes responsáveis por ele ter podido ser pensado, executado e mantido durante todos estes anos e anos a fio.»)


A situação actual da TAP é de uma enorme gravidade e representa um problema de particular importância de que, todavia, quase ninguém parece querer falar.

É que uma companhia aérea de bandeira, ou seja, gerida pela lógica da defesa dos interesses gerais do país e não pelo objectivo do lucro de interesses financeiros privados, é um instrumento estratégico fundamental para o desenvolvimento económico e social de qualquer Estado.

Mas é-o seguramente ainda mais para um país como Portugal, que tem não só cinco milhões dos seus cidadãos espalhados pelo mundo, como também duas regiões autónomas constituídas por ilhas atlânticas e ainda relações privilegiadas – que, aliás, podiam e deviam ser mais desenvolvidas – com as suas antigas colónias. Isto, por facilmente compreensíveis e inegáveis razões quer de unidade política nacional, quer de coesão económica e social e de promoção da igualdade e solidariedade entre todos os cidadãos, quer enfim do propiciar e do fomentar de relações políticas, económicas e culturais, em pé de igualdade e reciprocidade, com tais países.

Se a todas estas razões somarmos ainda o facto de Portugal ser o país mais ocidental da Europa e, logo, o primeiro a ser sobrevoado pela maior parte do tráfego aéreo que vem do outro lado do Atlântico, torna-se então absolutamente evidente a utilidade e, mais do que isso, a necessidade de o nosso país dispor de uma companhia aérea que sirva adequadamente todos aqueles objectivos. E é precisamente para isso que a TAP – fundada em 14 de Março de 1945 – deveria servir. Mas não serve!

Desde logo, a verdade é que a teoria de que gestores vindos do sector privado, como Fernando Pinto (que já conduzira a Varig à falência e veio para a TAP em 2000 com a confessada missão de vender a companhia a privados) seriam os mais competentes e eficientes para assegurar a boa administração da TAP levou foi a que esta acumulasse sucessivos prejuízos[1], os quais serviram depois de pretexto para defender a sua privatização.

O certo é que Fernando Pinto e as suas administrações conduziram sucessivamente a TAP ao desastre financeiro com as medidas absolutamente inaceitáveis mas adoptadas para aumentar de qualquer modo as receitas, tais como a prática de preços astronómicos nas viagens de e para as regiões autónomas, a eliminação de voos (sob a habitual não-razão das “razões de ordem técnica”) para juntar num só deles os passageiros de dois ou três diferentes, a redução das tripulações para o número mínimo de segurança mas obrigando-as a desempenhar tarefas comerciais, a completa degradação do serviço de bordo (designadamente de refeições) e a adopção de cavernícolas medidas laborais como a de prejudicar na progressão na carreira e nos salários os trabalhadores que exerceram, por exemplo, os seus direitos de parentalidade.

O desastre financeiro da TAP começou desde logo com o famigerado negócio da compra da VEM (a empresa de manutenção da Varig), celebrado em 2007 por Fernando Pinto com a decisiva intervenção do amigo do peito de António Costa, 
 Diogo Lacerda Machado (através da empresa Geocapital) e que representou seguramente uns milhões para os bolsos de alguém, mas sobretudo um buraco de 500 milhões de euros nas contas da TAP[2]!

E fizeram-no depois com a desvalorização e degradação do justamente prestigiado sector de manutenção da companhia, com a imposição da política do “stock 0” dos sobresselentes e com a utilização dos equipamentos e das tripulações no limite (ou mesmo para além dele) da sua capacidade normal, fazendo com que, ao mínimo problema com uma aeronave ou com uma tripulação numa dada operação de voo, todas as seguintes caíssem como peças de dominó, tal como sucedeu de forma gritante no Verão de 2014. E depois, para procurar apagar o fogo com gasolina, ir contratar, designadamente em regime de wet-lease, aviões e tripulações a outras companhias, algumas delas cujos parâmetros de segurança não eram propriamente fiáveis ou sequer conhecidos, mas a preços exorbitantes, agravando assim e ainda mais a situação financeira da empresa.

As várias administrações da TAP

Esta era, pois, a “excelência” dos métodos e das lógicas da gestão privada numa empresa pública, mas levada consecutivamente a cabo para justificar a privatização que foi inicialmente defendida em 1991 pelo governo de Cavaco Silva, que aprovou mesmo a sua transformação em sociedade anónima pela Resolução do Conselho de Ministros de 20 de Junho desse ano, 
ideia depois retomada por António Guterres (em 1995), Santana Lopes (em 2004) e José Sócrates (em 2006, aqui já com a ideia da dispersão do seu capital em bolsa).
  
Com o chamado “memorando da Tróica” – assinado em Maio de 2011 pelo governo de Sócrates com o acordo do PSD e do CDS e que previa no seu ponto 3.31, a venda (privatização) da TAP até ao final desse mesmo ano – esse processo foi acelerado, embora não à velocidade que o FMI, a Comissão Europeia e o Banco Central Europeu pretendiam.  E, assim, foi o governo Coelho/Portas – cujo mandato, recorde-se, decorreu de 21/06/ 2011 até à tomada de posse do primeiro governo de António Costa em 30/10/2015 – que levou a cabo a respectiva consumação. 

Após o falhanço em 2012 da primeira tentativa de venda (a qual chegou ao fim com um só candidato, o  empresário Gérman Efromovich, com um currículo mais que duvidoso e com dupla nacionalidade, colombiana e brasileira, o que o Direito da União Europeia não permitia), o governo de Passos Coelho e Paulo Portas tratou, sobretudo através do então Secretário de Estado dos Transportes, Sérgio Monteiro, de fazer consumar de qualquer maneira o negócio da venda, autenticamente ao desbarato de 61% do capital social da TAP à Atlantic Gateway, assinando o respectivo contrato em Junho de 2015.

E o que é a dita Atlantic Gateway? É um consórcio formado propositadamente para este negócio pelo dono da então praticamente falida companhia Azul, Linhas Aéreas Brasileiras, o norte-americano David Neeleman. Para tal, este chamou Humberto Pedrosa, empresário português do sector dos transportes rodoviários, para assim conferir à nova dona da TAP uma pretensa natureza europeia e desta forma tornear as normas de direito comunitário que impõem que uma companhia de aviação europeia só por uma entidade europeia possa ser comprada.

Mas desde o início se percebeu que o verdadeiro novo dono da TAP era, e é, um só, David Neeleman, como se compreendeu ao que ele vinha – vampirizar a TAP para salvar a sua Azul e posteriormente vender a sua parte do capital por um preço muito superior ao valor do que pagara aquando da venda.

Apesar da complicada e habilidosa engenharia jurídico-financeira construída precisamente para escamotear todas essas realidades, aquilo que se foi constatando ao longo do tempo é agora por inteiro confirmado com o anúncio das “adiantadas negociações” para a venda do capital privado da TAP à alemã Lufthansa, a qual, muito significativamente, não confirma, mas também não nega tais negociações.

É claro que, entretanto, e perante a queixa-crime apresentada pela Associação “Peço a Palavra!” (relativamente aos factos com relevância criminal que foram sendo praticados para escamotear a verdadeira natureza da negociata da venda ilegal e ao desbarato da companhia aérea nacional a um americano dono de uma companhia de aviação brasileira), o nosso Ministério Público, depois de se limitar a ouvir os intervenientes e defensores deste negócio e de não realizar uma só das diligências de prova que se impunham para tratar de apurar efectivamente toda a verdade dos factos, “engonhou” o processo durante cerca de três anos e depois… tratou de o arquivar! Mas também, depois do que o mesmíssimo Ministério Público já tinha feito com casos como os dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, dos swaps, das parcerias público-privadas, tal, infelizmente, já não era de todo de estranhar…

A “reversão” da privatização da TAP

O certo, porém, é que, hoje, já se sabe bastante mais acerca daquilo em que, na prática, consistiu não só o acordo de venda de Junho de 2015 como, mais do que isso, o acordo chamado de “reversão” da privatização da TAP (estabelecendo 45% do capital da TAP para a Atlantic Gateway, 50% para o Estado e 5% para trabalhadores) que o governo de António Costa celebrou em 2016 com a Atlantic Gateway, ou seja, com David Neeleman (e com Humberto Pedroso, uma vez mais, apenas a dizer que sim). Ou seja, vai-se percebendo cada vez melhor que é o mesmo Neeleman quem, desde 2015, efectivamente manda na TAP e que o grande negociador desta “solução” foi o amigo de Costa, Lacerda Machado, devidamente premiado logo depois com um lugar na administração da companhia!

Ficámos também a saber que, mesmo tendo ficado a deter apenas 50% do capital social da empresa, por força de um acordo parassocial mantido secreto, a gestão da TAP é afinal exclusivamente da Atlantic Gateway e, havendo lucros, esta terá direito a 90% dos mesmos (ainda que só detendo metade do capital), enquanto o Estado, maior accionista, terá apenas 5% dos respectivos direitos económicos.

Mais! Com a dita recompra da TAP, o Estado – que assim rigorosamente nada manda na gestão da empresa – assumiu diversas e gravosas obrigações: desde logo, e perante a banca, a garantia da dívida financeira da empresa, no valor de 615 milhões de euros; depois, a obrigação de garantir que os capitais próprios da TAP não sejam inferiores a -571,3 milhões de euros, sendo o Estado o único responsável pela capitalização sempre que os referidos capitais próprios desçam abaixo do limite mínimo assim definido; e, finalmente, a obrigação de assegurar a substituição da Atlantic Gateway na realização de prestações acessórias.

Como se não bastasse o valor ridículo e ruinoso da venda da TAP em 2015 (150 milhões de euros que, mesmo assim, não entraram de todo nos cofres do Estado pois foram integralmente destinados ao reforço do capital da empresa), a farsa do novo acordo não reverteu coisa nenhuma da lógica e do essencial do primitivo negócio: compromissos e obrigações para o Estado português (ou seja, para os bolsos de todos nós) e vantagens, prémios e lucros para os bolsos do Sr. Neeleman, da sua empresa e dos seus amigos.

A sucessiva deterioração da TAP

Sob a gestão num primeiro momento ainda de Fernando Pinto e depois do Sr. Antonoaldo Neves, a TAP foi sendo completamente vampirizada pela Azul, que a usou desde logo para aceder a rotas de que não dispunha (designadamente de e para a Europa e a África) e em que, por si, não conseguia entrar. Depois, também serviu para, sob a capa da cedência à TAP de inúmeras aeronaves da Azul (cuja frota estava então quase toda parada), esta vir pôr essas aeronaves a fazerem as respectivas, e altamente dispendiosas, operações de manutenção a cargo da TAP, para logo depois as recuperar com essas operações feitas “à borla”.

Mais! Foi também noticiado – e nunca desmentido pelos próprios – que terá sido a Airbus a disponibilizar a Neeleman o dinheiro necessário (70 milhões de euros) para ele concorrer à privatização da TAP, em contrapartida do compromisso de, conseguindo o mesmo Neeleman ficar com ela, como ficou, adquirir depois à mesma Airbus dezenas e dezenas de aeronaves A320 e A330 (em vez de uma encomenda inicial de 12 aviões A350 já paga pela TAP).

Assim, o Sr. Neeleman pôde comprar a TAP com dinheiro que não era dele, mas sim da própria TAP e disponibilizado pela Airbus a título de “desconto” no preço das prometidas compras de novos aviões cuja aquisição tem, efectivamente, vindo a acontecer, mas em escala cada vez maior, gerando para a TAP obrigações financeiras verdadeiramente incomensuráveis[3].

Assim, o mesmo Sr. Antonoaldo Neves, que se gaba de, em 2019, a TAP ter ao serviço 105 aeronaves (número considerado pelos especialistas como manifestamente exagerado para a dimensão da companhia e para as necessidades reais dos voos que estrategicamente lhe deveria interessar realizar) e que “engaiola” um número cada vez maior de passageiros em aviões com cada vez menos conforto para os passageiros e com cada vez piores condições de trabalho para os tripulantes, é o mesmo que se “esquece” de informar qual o custo da aquisição daquelas mesmas aeronaves (cerca de 1 milhão de euros mensais por cada avião) e como é que esse custo vai ser afinal suportado e por quem.

Os prémios da administração 

E é ainda este mesmo personagem que, do mesmo passo que vai acumulando enormes prejuízos (de 118 milhões de euros em 2018 e, apesar de todas as promessas, de 105,6 milhões de euros em 2019), vai decidindo e distribuindo fabulosos prémios por si próprio, pelos seus amigos da administração, a começar por Abílio Martins, administrador da Área Financeira e homem de mão de Zeinal Bava e Miguel Relvas, e pelos homens e mulheres da sua confiança, como já fez no ano passado e se prepara para fazer de novo este ano[4].

O provocatório acinte desta gente resulta de que ela bem sabe que, como os membros da Comissão de Vencimentos e de qualquer dos órgãos sociais da TAP só podem ser substituídos ou destituídos de funções pela maioria qualificada de 2/3 (66,7%) dos votos representativos do capital social, maioria qualificada que o Estado não tem, esses administradores e os seus amigos que lhes aprovam as remunerações e prémios vão poder manter-se no “poleiro” até ao fim dos respectivos mandatos.

E, assim, é um autêntico “é fartar vilanagem!” aquilo a que temos assistido, numa sucessão de acontecimentos que são verdadeiramente criminosos, e não apenas do ponto de vista dos interesses políticos, económicos e sociais do país, mas também e até do ponto de vista criminal, não fora termos, também aqui, um Ministério Público que, quando se chega a este tipo de criminalidade – que ele tanto diz combater… – afinal não vê, não ouve e não fala nada.

Bolsos cheios, malas aviadas

E as mais que previsíveis consequências de tudo isto aí estão já bem à vista: quando este autêntico saque terminar, teremos uma companhia aérea absolutamente secundarizada e ultrapassada nos voos internacionais e transformada numa mera companhia regional, numa espécie de Portugália um pouco maior e, sobretudo, completamente endividada. E teremos também um Estado a vir aos bolsos dos contribuintes para cumprir as tais obrigações financeiras a que todos os governos dos últimos 30 anos, mas muito em particular os da última década, e sempre nas nossas costas, trataram de nos amarrar.

Entretanto, e aproximando-se a hora do crash que este tipo de gestão torna cada vez mais inevitável, eis que assistimos a um outro indecoroso (mas, em boa verdade, também previsível) espectáculo: o Sr. Neeleman, bem mostrando uma vez mais que é ele quem manda na Atlantic Gateway, trata de negociar a venda à Lufthansa dos 22,5% do… Sr. Humberto Pedrosa (que, confessadamente, nem sequer falou ainda com a companhia alemã porque quem disso trata é, claro, o dono da Azul…) por um montante de 180 milhões de euros, que pressupõe a avaliação da TAP em 800 milhões, ou seja, quase seis vezes mais do que, há quatro anos atrás, os privados deram por ela! E quando tiver decorrido o prazo de cinco anos durante o qual ele tem de se manter como associado do consórcio Atlantic Gateway, o Sr. Neeleman também decerto fará o mesmo e regressará então aos Estados Unidos com os bolsos ainda mais cheios à culpa dos papalvos dos portugueses, iludidos e burlados cem vezes…

A impunidade e a cumplicidade

A História julgará decerto todos os executantes e beneficiários deste autêntico “golpe do baú” e, mais até do que eles, os governantes e dirigentes responsáveis por ele ter podido ser pensado, executado e mantido durante todos estes anos e anos a fio.

Mas a cumplicidade dos silêncios ensurdecedores a este respeito é ainda mais revoltante. 

Na verdade, porque é que, face a esta ignomínia, ninguém, a começar pela Comissão de Trabalhadores e pelos Sindicatos da TAP e a acabar nos partidos e organizações que se dizem de esquerda ou, pelo menos, minimamente preocupados com o futuro do país, diz rigorosamente nada sobre isto?

Perante o saque e a destruição da TAP, antes de mais os seus próprios trabalhadores, mas também todos nós, cidadãos em geral, ainda que aqueles que se dizem nossos representantes nada digam e nada façam a este respeito, devemos arrogar-nos o direito, que é também um dever, de dizermos “NÃO!” a todo este escândalo, de pormos cobro a este roubo e de tudo fazermos para que todos os seus autores (que hoje se riem na nossa cara) tenham que assumir as suas responsabilidades e pagar pelos seus crimes!

António Garcia Pereira
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[1] Em 2009, eles atingiram os 290 milhões de euros. Segundo as contas oficiais, e com todas as cosméticas contabilísticas, os prejuízos foram de 42,2 milhões de euros em 2012, de 5,9 milhões de euros em 2013 e de 85,1 milhões de euros em 2014.

[2] Diogo Lacerda Machado foi quadro e administrador da empresa Geocapital, Investimentos Estratégicos, SA, com sede em Macau. Em 2005, a TAP e a Geocapital compraram a já então semi-falida Varig, Engenharia e Manutenção (VEM) para, dois anos depois, a Geocapital vender à TAP a sua participação no capital social da VEM por 25 milhões de dólares, ou seja, pelo valor de 21 milhões inicialmente previsto, acrescido de um “prémio” de 20%, que foi para os bolsos de alguém. Depois de ter sido nomeado consultor pelo Primeiro-Ministro António Costa e de ter negociado o acordo com Neeleman e Humberto Pedroso, Lacerda Machado foi nomeado vogal do Conselho de Administração da própria TAP. 

[3] Em Abril de 2018, por exemplo, foi tornado público pela própria TAP que a encomenda por ela feita à Airbus de 71 (!?) novos aviões implicaria o custo de, pelo menos, 9.970,2 milhões de euros, num custo médio por avião de mais de 140 milhões de euros. E em Fevereiro de 2020 foi anunciada a chegada de dois aviões A-330 Neo, sendo esperados mais dez até final do ano.

[4] Depois de, em Maio de 2019, e não obstante o gigantesco prejuízo de 2018 (118 milhões de euros), ter decidido atribuir prémios no valor global de 1,171 milhões a apenas 180 dos 7000 trabalhadores da TAP, pagando, a título desses mesmos prémios, 110 mil euros quer ao CEO Elton de Souza, quer ao administrador Abílio Martins, bem como 88 mil euros ao Director Técnico Mário Lobato Faria e 17,8 mil euros à Directora do Departamento Jurídico da TAP, e mulher do Presidente da Câmara de Lisboa Fernando Medina, a administração da TAP, mesmo depois dos mais 105 milhões de euros de prejuízos em 2019, prepara-se para fazer algo similar em 2020, até encher os bolsos dos próprios administradores e seus amigos.



sábado, 6 de julho de 2019

«A NOVA ESCRAVIDÃO DA CLASSE TRABALHADORA» - ENTREVISTA COM PAUL CRAIG ROBERTS



"The reason Noam Chomsky and I can speak freely is because we don’t want anything from the establishment. We are not depended on them. If we were, we would be shut down. So, you have a situation in the West where there is hardly anybody who can afford to speak freely."


(A razão porque Noam Chomsky e eu próprio podemos falar livremente é porque não queremos nada do 'establishment'. Não estamos na sua dependência. Se fossemos dependentes deles, seriamos calados. Portanto, temos uma situação no Ocidente onde quase ninguém pode permitir-se falar livremente.)



Sobre o Prof. Paul Craig Roberts  e seu pensamento:

Entrevistas de P. C. Roberts a Hanne Nabintu Herland: 


terça-feira, 29 de agosto de 2017

EXPLORAÇÃO ACRESCIDA E AUSÊNCIA DE SINDICATOS COMBATIVOS


Notícias deste tipo são quotidianas e basta olhar à roda, perguntar a familiares ou amigos, para constatar que estas notícias, longe de serem alarmistas reflectem aquilo em que se transformou o mercado de trabalho.

Os sindicatos estão ausentes dos locais de trabalho; as direcções estão fechadas nos seus gabinetes ou a fazer tudo menos aquilo para que foram eleitas. Sim, não falham uma «manif» da CGTP, se forem convocadas... mas fazerem o trabalho quotidiano e ingrato... 

A ausência de sindicalismo sério e de classe torna as situações narradas impossíveis de defesa do ponto de vista dos explorados. Os patrões têm em Portugal um paraíso porque o «sindicalismo» se confunde com a militância política, que NÃO É. 

A anexação e subordinação dos sindicatos por partidos (sobretudo de «esquerda») tem as consequências que se podem observar. Ninguém da «sacro-santa» esquerda quer dar o braço a torcer e reconhecer isto: os sindicatos são órgãos da classe trabalhadora toda. Cativá-los para lutas políticas e desmobilizá-los das lutas laborais é uma traição muito grave. 


Só quando a nova geração tiver varrido práticas enquistadas nos sindicatos; só quando houver um grau de consciência de classe que lhes proíba fazer como seus antecessores, poderão as coisas mudar no campo sindical e laboral.


sexta-feira, 14 de julho de 2017

A ESCRAVIDÃO* DE QUE NÃO SE FALA

 *[ A condição de escravo não implica que a exploração seja violenta, brutal, penosa, mas apenas que o trabalho não é remunerado, é uma obrigação do trabalhador, mas não do seu patrão. Este pode decidir dispensar o escravo quando quiser, pois não existe qualquer tipo de contrato.]

TRABALHO GRATUITO DE MESTRANDOS E DOUTORANDOS, PARA VANTAGEM DOS «MANDARINS» NA UNIVERSIDADE


Muitos estudantes de mestrado e de doutoramento são «obrigados na prática» a darem aulas gratuitas e mesmo a classificar trabalhos de alunos de licenciatura (ambas atividades que envolvem evidentes responsabilidades profissionais). 

                       Image result for slave trade

Existe legislação suficiente para caracterizar como criminosas estas práticas, aliás perfeitamente documentáveis. No entanto, nem os agentes do poder, nem mesmo o «contrapoder» dos sindicatos intervém. Porquê?
A cumplicidade ou conivência generalizada com um crime, a complacência com ele, torna-o ainda mais grave e hediondo. 
É um comportamento criminoso perfeitamente consciente o uso abusivo do trabalho gratuito de estudantes. O mais notório caso é o de atividades docentes, para as quais se exige legalmente qualificação e reconhecimento específico. 
Sem darem um combate eficaz a estas práticas, sem as exporem, de tal forma que os atuais beneficiários delas tenham vergonha e se inibam de continuar, não é credível que políticos declarem «que querem combater injustiças, trabalho precário», etc. 
Combata-se já a exploração e o trabalho escravo e precário de milhares de estudantes na universidade.



Algumas pessoas dizem - e outras repetem - que «é o sistema» ou ainda que «instalou-se uma cultura»: isso são apenas desculpas lançadas pelos beneficiários do trabalho gratuito, eles próprios. 

O facto de serem docentes universitários, não significa que tenham escrúpulos. Há pessoas que, quando atingem um certo estatuto, julgam que podem fazer praticamente o que quiserem e não ser incomodadas. 
Julgam-se acima da lei; é exatamente um sistema feudal. 

Mas num Estado de Direito isto é crime. Isto chama-se sobre-exploração / trabalho escravo / chantagem / assédio.

Em Portugal, não consegui obter reportagens sobre o assunto, o que não significa de modo nenhum que seja menos grave ou generalizado do que noutros sítios. Aqui, abaixo, deixo uma selecção de artigos que mostram várias facetas do problema.


Condição de escravo moderno:



Em Espanha, já a própria universidade reconhece em parte o problema:

Exploração miserável na Austrália:

Em França, estão organizados para combater este flagelo:

Em Portugal...nada! Se alguém, entretanto, souber de alguma notícia relativa ao assunto, peço me informe!

terça-feira, 25 de outubro de 2016

CRÓNICA DE UM CRIME SILENCIOSO


 A História da Segurança Social, a peça central do funcionamento do chamado Estado Social, é desconhecida da maior parte das pessoas. Mesmo as pessoas com uma formação cívica e política relativamente elevada têm falhas gritantes a esse nível, tão essencial para a compreensão da nossa História coletiva. Certamente não sou a pessoa mais indicada para retraçar essa História, que se poderia fazer iniciar muito mais cedo, mas que em termos práticos, nos países da Europa ocidental e América, se pode situar no pós-II Guerra Mundial.

Nestes países, quer fossem vencedores, quer vencidos, ou mesmo «neutrais» como Portugal, houve uma transformação das relações de trabalho e da relação dos cidadãos com o Estado. Já não era possível o Estado ser indiferente ao que se passava com os trabalhadores, com os pobres, com os doentes e inválidos, com os idosos. O chamado Estado Social foi a resposta do «Ocidente» ao perigo vermelho, ou seja, ao efeito sedutor da propaganda do socialismo «real» nos países do bloco de Leste, conferindo direitos e condições de proteção social inauditas do lado de cá da «cortina de ferro».  

Houve negociação com os sindicatos sobre toda uma série de assuntos, criando-se uma ideia de «parceria»: o conceito de que os parceiros sociais poderiam entender-se, numa sociedade onde o patronato e os trabalhadores teriam interesses contraditórios, por vezes, mas compatíveis. O papel de «conciliador» caberia ao Estado e seus representantes vistos como neutros, como «fiel da balança», etc. Esta ficção convinha a uns e a outros, impedindo uma viragem dos trabalhadores para uma visão revolucionária, contentando-se estes em reivindicar dentro do quadro institucional.

Esta política só começou a sofrer fraturas quando houve uma série de crises sistémicas que abalaram a visão interclassista de «coesão nacional». Esse período ocorreu na década que vai de 1968-69 a 1978-79, variando os momentos agudos de país para país, mas no geral, em quase todos os países do «Ocidente» (e mesmo, vários países do Pacto de Varsóvia) houve momentos de grande desestabilização política e social nessa década.
A resposta do capital internacional, que saiu vitorioso do confronto, foi logo a partir de 1980 e não se fez esperar: desmantelamento programado do «Estado Social», mas peça por peça… para não gerar convulsões.

Em Portugal, com o 25 de Abril de 1974 houve, não só uma revolução política, como também foram desmanteladas fatias importantes do tecido produtivo. 

- O país foi acumulando défices, que eram preenchidos, nos orçamentos sucessivos, com receitas da Segurança Social, através de «empréstimos» mais ou menos avultados, a juro muito inferior ao dos mercados. A reposição destas verbas forçadamente emprestadas, era tardia e como o juro era irrisório, isso equivaleu a uma descapitalização dos fundos próprios durante dezenas de anos. Recorde-se que, nalguns anos, as taxas de inflação eram acima de 10 %; isto foi um dos fatores mais importantes para socavar a sustentabilidade do modelo de Segurança Social, herdado do regime de Salazar-Caetano. 
- O outro fator foi a destruição programada (pela entrada na então CEE) dum tecido produtivo frágil, mas do qual dependia a sobrevivência da população portuguesa: destruição da agricultura, das pescas, da pequena e média indústria. Os grandes interesses financeiros/industriais e as grandes «coutadas» agrícolas reapareciam, mas numa perspetiva de saque, pondo os despojos a salvo em «offshore», protegidos do olhar intencionalmente míope dos governos …

A proporção capital/trabalho, no que toca à sustentação do Estado, é completamente desequilibrada neste país. Existe também esse desequilíbrio noutros países; também noutros países as classes mais abastadas conhecem e usam todas as artimanhas para diminuir legalmente impostos ou praticam fraudes. Mas aqui, em Portugal, o que o Estado extrai sob forma de impostos, dos que trabalham ou trabalharam, para alimentar o orçamento, é sem dúvida muito mais,  proporcionalmente.

Costumo dizer que o Estado Português sujeita o povo trabalhador a um regime de impostos de nível semelhante ao da Suécia. Porém, para nosso infortúnio, a qualidade dos serviços que o Estado presta em retorno aos cidadãos não corresponde - em nada - à do povo sueco! Em qualidade de serviços públicos, a população portuguesa pode realisticamente ser colocada ao nível do «Terceiro Mundo».
Na verdade, o Estado impõe esse pesado nível de impostos áqueles que não podem fugir, fazendo a retenção obrigatória do IRS (Imposto sobre Rendimento de Singulares) nos salários e pensões, tendo aí a base de sua receita. 
A partir daí, não faz muito esforço para ir buscar os impostos às empresas, aos acionistas, em especial à banca. Porém, em caso de insolvência, os empresários e banqueiros podem contar com a mão amiga do Estado, que irá recapitalizar – com os nossos impostos- os bancos descapitalizados e mal geridos. É o modelo «assistencial» (ou «Welfare State») para os ricos e o capitalismo mais inflexível para os pobres, em toda a sua plenitude.

O povo e os trabalhadores deste país devem tomar consciência de que a Segurança Social é deles: Só poderão recuperar alguma dignidade e segurança económica se não permitirem que o fruto do seu trabalho seja «gerido» por alguns incompetentes ou criminosos, que nunca lhes prestam contas, que não lhe devolverão nunca o devido!  
A gestão da segurança social pelos próprios trabalhadores é possível: ela foi a base do modelo, em vários países ocidentais, com participação dos sindicatos, associações de reformados, etc. 
Em Portugal, as «Caixas de Previdência» do regime fascista de Salazar estavam nas mãos das «câmaras corporativas» e portanto, nunca poderiam estar sob controlo dos trabalhadores. 
Lamentavelmente, aquando do 25 de Abril e anos subsequentes, perdeu-se a oportunidade das «Caixas de Previdência» serem geridas pelos trabalhadores, através de seus legítimos representantes.
Houve preocupação de manter este manancial de dinheiro nas mãos de quem detivesse o poder político, o governo. Os responsáveis da Segurança Social foram nomeados sempre pelo poder político vigente, nunca foram eleitos pelos trabalhadores e reformados.

Para se conseguir mudar algo de significativo, terá de haver uma mudança profunda na maneira como a população encara estes assuntos. A população portuguesa está muito alheada, para não dizer alienada do que se passa.
Ela terá de compreender que - de facto - a Segurança Social não é parte do governo, não é um ministério. Ela deveria ser devolvida ao povo, não privatizada, mas sim gerida por iniciativa e com participação do povo (através de sindicatos e outras associações). A Segurança Social, na verdade, é pertença dos trabalhadores ativos e reformados portugueses, tal como os capitais por ela geridos.