A apresentar mensagens correspondentes à consulta Bretton ordenadas por relevância. Ordenar por data Mostrar todas as mensagens
A apresentar mensagens correspondentes à consulta Bretton ordenadas por relevância. Ordenar por data Mostrar todas as mensagens

segunda-feira, 23 de janeiro de 2023

«IN GOD DOLLAR WE TRUST» ?

 

                                    Nova Iorque: Empire State Building visto no ocaso


                       Gráfico retirado dum artigo de A. Mcleod, que pode consultar AQUI

Nós somos matraqueados permanentemente com a «força do dólar», em relação às outras divisas ocidentais, pelo menos, as que têm maior peso tanto no comércio, como enquanto membros de SDR,  a famosa «divisa» artificial, que é (de facto) um cabaz de divisas, usado na contabilidade interna do FMI.  Mas, o comércio e a participação dos países nas trocas globais não se resume ao «Ocidente». Este conjunto de países é denominado assim, embora devessem ser designados por aquilo que - de uma forma, ou de outra - são: Constituem os mais fieis aliados (ou vassalos) dos EUA; os países de língua inglesa (Austrália, Nova Zelândia, Reino Unido, Canadá e EUA), a Europa da União Europeia, o Japão, a Coreia do Sul e pouco mais (cerca de 15% da população mundial).

O sistema de Bretton Woods, foi instaurado quando os EUA eram a potência tecnicamente vencedora da 2º Guerra Mundial. A URSS e muitos outros países que lutaram contra as potências do Eixo (Alemanha hitleriana e potências suas aliadas) estavam de rastos. A sua vida económica e social sofreu de tal maneira, que não estavam muito melhor que os países vencidos (Alemanha, Japão, Itália, e outros.)

Assim, quando foram assinados os acordos de Bretton Woods em 1944, e nos anos imediatos, os EUA dominavam o comércio mundial (cerca de 50% deste), possuíam a maioria das reservas de ouro em bancos centrais (cerca de 70 % do ouro guardado nos bancos centrais) e tinham uma infraestrutura industrial intacta e em plena expansão. 

Um sistema de Bretton Woods não poderá voltar a ser reinstalado, não porque seja impossível reinstaurar um padrão-ouro (embora seja uma má solução), mas porque não existe nenhuma potência com o poderio hegemónico dos EUA à saída da IIª Guerra Mundial.

Um futuro multipolar será sempre mais instável, que um futuro unipolar. Mas, um sistema global unipolar não dará a um conjunto de países, possuindo a maioria da população mundial e dos recursos em matérias-primas, a possibilidade de fazerem valer os seus interesses e de poderem negociar em termos aceitáveis, a sua participação no comércio, no investimento e na repartição do bem-estar individual e social, ao nível mundial. Por muito injusto que seja um mundo multipolar, como o foi em diversos períodos da História, para aqueles povos submetidos a um império ou a uma nação mais forte,  nada se compara com a força bruta e a ausência total de consideração pelos direitos e pela dignidade dos mais pobres, num império mundial único, hegemónico. 

O império liderado pelos EUA tem demonstrado isso, neste pequeno intervalo de tempo, que vai da implosão da União Soviética (1991), até hoje. No entanto, reveste o seu desprezo absoluto, com a hipocrisia típica da civilização de comerciantes, aventureiros e donos de escravos - que foram os impérios Português, Espanhol, Britânico, Holandês - especializados na guerra de razia e de rapina, que foi o modo como se expandiram e enriqueceram estas potências coloniais desde o século XVI até hoje. 

Não é por o comércio internacional ser feito em tal ou tal unidade de valor, vulgo «moeda», que a troca é mais ou menos desigual. Desde Ricardo, que se reconhece que determinadas nações têm determinadas vantagens competitivas, no comércio internacional, em relação a determinados produtos industriais, agrícolas ou minerais. É sobretudo o preço do trabalho que conta, por agregado. Assim, os países onde o trabalho é mais barato, foram aqueles que receberam as indústrias deslocalizadas dos países industriais tradicionais, os países europeus ocidentais e os EUA, sobretudo. 

Mas o globalismo, ideologia associada ao neoliberalismo, está completamente posto em causa. Este globalismo «reinou» durante um curto período, em que as potências industriais europeias e norte-americanas exportaram as suas indústrias para beneficiarem da mão-de-obra barata dos países ex- coloniais, ou que tinham uma grande diferença no seu grau de desenvolvimento. Estes países, entretanto, fortaleceram-se e tornaram-se mais capazes de impor suas condições a países outrora dominantes. 

Esta mudança entra em colisão com a mentalidade colonialista e imperialista, das classes dirigentes dos países ocidentais, que também se transmitiu a extratos explorados desses mesmos países.  Órfã de uma instância política que formalmente a representasse, a classe trabalhadora dos países do Ocidente virou-se para os demagogos de extrema-direita, ou confinou-se na rejeição da política. O abstencionismo crónico tem sido maior na classe trabalhadora marginalizada,  do que na «classe média», ou classe trabalhadora integrada, que tradicionalmente vota à esquerda.

Do ponto de vista do império dominante, este já percebeu que é demasiado tarde para inverter a tendência global. Trump não foi bem sucedido, porque - em parte - não conseguiu o entusiasmo interclassista e patriótico que ele esperava para a sua campanha de fazer regressar as indústrias ao solo americano. Sem dúvida, ele foi sabotado pelo «establishment» de Washington, mas também não conseguiu uma adesão significativa dos setores da indústria, ditos «high-tech», tecnológicos. 

As mutações do sistema monetário são sempre consequência de um duplo jogo de forças: As forças relacionadas com o capitalismo mais dinâmico - hoje, a China e outros países asiáticos, principalmente - por um lado, e por outro, com a capacidade militar global: Sabe-se que as simulações duma guerra Russo-Chinesa / Americana (NATO), realizadas no Pentágono, deram invariavelmente resultados negativos para as forças americanas e suas aliadas. 

Assim como a arquitetura de Bretton Woods foi consequência da prevalência dos EUA no comércio, indústria, finanças e domínio militar, após a IIª Guerra Mundial; também a nova arquitetura global do sistema monetário terá de refletir a realidade das trocas comerciais, das forças produtivas, das capacidades de defesa e da inovação tecnológica, que os diversos atores mundiais terão alcançado, na atualidade. 

O facto de o dólar surgir como «forte», em relação a outras moedas ocidentais não significa que a divisa dos EUA continue a possuir a mesma prevalência mundial. Existe uma diminuição significativa das trocas efetuadas em dólares, numa parte importante do Mundo, o que significa que há rutura, face ao período de trocas efetivamente mundializadas. Significa que os países da esfera político-económica do dólar, estão encerrados numa de matriz de tipo neocolonial em que a potência dominante tem a possibilidade (e exerce-a) de dizer o que esses países devem comerciar e com quem, com que tipo de mercadorias e com que formas de pagamento. O sistema de sanções montado pelos EUA é muito astuto, no curto prazo, porém a impossibilidade das empresas europeias comerciarem com países possuidores de grandes reservas de energia (como o Irão) ou com a Rússia e China, que possuem certos produtos praticamente insubstituíveis, no curto prazo (certos metais, como o titânio, ou terras raras, ou ainda, os «microchips»), traduz-se numa perda de competitividade  da União Europeia, nos mercados mundiais. Isto é válido para todos os seus membros, em especial, para o gigante industrial, a Alemanha.

Por contraste, os países dos BRICS+ e das Novas Rotas da Seda têm reais perspetivas de desenvolvimento, de alargamento dos mercados. Os países da «velha Europa» não estarão em condições de competir, devido à diminuição da sua parte nos mercados, ao acréscimo de custos de produção e devido à «mão de aço» da potência «hegemónica regional» , os EUA. Por enquanto, estes comportam-se como o senhor feudal (o suserano) em relação aos vassalos. 

Mas, embora o feudalismo tenha durado alguns séculos, o novo feudalismo dos EUA, perante outro sistema multipolar, não poderá manter uma «hegemonia regional», durante muito tempo. Uma tal situação é intrinsecamente instável, não poderá durar mais do que alguns decénios.

----------------------

(1) O  «SDR» significa Special Drawing Rights, em português, Direitos de Saque Especiais.

--------------------------------------------------------------------

PS1: Para compreenderes a estratégia globalista em todas as suas vertentes, lê:

https://www.globalresearch.ca/globalist-cabal-meets-again-prepare-world-domination/5805836

PS2: Os dementes que estão no poder não se importam que seja desencadeada uma guerra nuclear; por outro lado, os povos estão de tal maneira doutrinados, que não percebem realmente o que representa a generalização do conflito Rússia/Ucrânia.  

https://caitlinjohnstone.com/2023/01/25/hardly-anyone-is-thinking-logically-about-the-risk-of-nuclear-war/

quinta-feira, 30 de setembro de 2021

A ÚNICA RESERVA GLOBAL DE VALOR QUE REALMENTE CONTA

Quando Janet Yellen vem afirmar que os EUA nunca*, no passado, tinham faltado às suas obrigações financeiras para com os detentores de obrigações do tesouro dos EUA, estava a querer fazer passar uma imagem, que ela própria sabia não ser rigorosa.

                                     Desde a criação da FED (1913): valor do dólar US

Com efeito, aquando do decretar da interdição da posse de ouro pelos particulares por Roosevelt em 1934, o dólar foi efetivamente desvalorizado em cerca de 40%, em relação ao ouro. No entanto, o ouro continuou sendo o padrão das diversas divisas, incluindo do dólar. Os investidores que tinham comprado obrigações do tesouro dos EUA chamadas «liberty bonds» - que, num sistema «padrão-ouro» correspondiam a pouco mais de 20 dólares por onça de ouro - tiveram de contentar-se em receber o principal em «novos» dólares (35 US$ por onça de ouro), não naqueles que tinham investido, inicialmente.

Uma segunda e bem conhecida falta de pagamento (default) foi o despegar definitivamente do dólar do padrão ouro, em 1971 por Nixon, ao decretar que fechava «provisoriamente» a convertibilidade do dólar em ouro. No sistema de Bretton Woods, os bancos centrais, dos países aderentes ao acordo, podiam trocar (até 1971) os dólares - detidos em reserva - por ouro, ao câmbio oficial de 35 dólares US por onça de ouro. Assim, os EUA falharam o seu compromisso de Bretton Woods. O ouro sofreu uma subida espetacular no mercado mundial, de 35 dólares a onça, para mais de 800 dólares. Os países aderentes ao acordo de Bretton Woods foram prejudicados com a falta dos EUA: a partir desse momento, um banco central que quisesse comprar ouro, teria de ir ao mercado abastecer-se pagando um valor múltiplo do que anteriormente lhe era garantido.

A terceira falta e a mais grave, é a que ocorre atualmente e tem ocorrido regularmente. Falo da inflação, do efeito de desvalorização das divisas, depreciando o seu poder de compra, logo o valor efetivo. Se és pago com 100 dólares e essa soma ficar a «dormir debaixo do colchão» (ou numa conta bancária a juro zero, ou quase zero) irás verificar, após alguns anos, que a referida soma de 100 só compra aquilo que antes podias adquirir com 50, ou seja, sofreste uma perda do poder de compra de 50%. Atualmente, calcula-se que a perda do valor do dólar US em termos de poder de compra, desde a famosa falcatrua de Nixon em 1971, é de cerca de 98%, por outras palavras, compras hoje por 1 dólar, a mesma coisa que em 1971 compravas por 2 cêntimos.

As outras divisas não fizeram um percurso muito melhor, foram perdendo poder de compra. Na zona euro, a transição oficial dos pagamentos em moedas nacionais para a nova divisa, originou uma inflação «escondida» e instantânea: Em Portugal, foi cerca de 50-60 %. Os novos preços, em euros, correspondiam a uma vez e meia, em média, os preços em escudos. O mesmo aconteceu com as outras divisas mais fracas, que aderiram ao sistema monetário instaurado em Maastricht.

A razão da persistência de um sistema (as divisas «fiat») tão imperfeito e injusto, é simples: os Estados têm vantagens com este sistema, ao contrário de todos os outros agentes económicos: pessoas, empresas, instituições. Os Estados pagam nominalmente as dívidas, mas em dinheiro desvalorizado; se pediram um empréstimo há vinte anos, agora pagam o principal numa moeda cujo valor é metade, ou menos, do seu poder de compra de há 20 anos atrás. 
Quase ninguém pode ter vantagem num tal sistema. Mesmo pessoas que têm muitas dívidas, e cujo valor nominal dessas dívidas desceu em relação ao seu valor real, só terão vantagem numa tal situação, se conseguirem uma atualização de seus rendimentos (do trabalho, ou doutras proveniências) bem acima da taxa de desvalorização do dinheiro. Por exemplo, se a desvalorização do dinheiro fosse de 2%, teriam de ter um acréscimo líquido bem acima dos 2%, pois os juros das dívidas também crescem com a inflação. Caso contrário, terão de trabalhar mais (ou ter mais rendimentos) para pagar os juros e o capital em dívida.

O problema, com este sistema «fiat», é que tudo é dívida: são dívida, as obrigações do tesouro dos diversos Estados, as obrigações das empresas. A criação monetária pelos bancos centrais é dívida; o dinheiro escriturário criado pelos bancos, quando fazem empréstimos, é dívida. O que recebemos em pagamento de bens que vendemos, ou do nosso trabalho, não é «dinheiro», mas dívida.

                                     Tabela com a dívida total, números oficiais e atuais, do governo dos EUA

A dívida existe mas, a probabilidade dela ser cobrada, releva de outra coisa que não dos meros cálculos financeiros. Releva da real ou estimada possibilidade de honrar essa dívida, ou seja, da confiança.
Quando um país possui o exorbitante privilégio de emitir dívida, sem nunca ter qualquer preocupação em pagá-la realmente, pois vai emitindo mais dívida para cobrir as dívidas anteriores e o mundo inteiro aceita isso, é preciso haver uma grande, enorme confiança na capacidade industrial deste país, na sua solidez no plano institucional e político. 
Mas os EUA, hoje em dia, já não oferecem nenhuma dessas garantias, ao contrário das primeiras décadas após a IIª Guerra Mundial. Nessa época, o dólar era considerado «tão bom como o ouro».
Agora, nem a força bruta (veja-se o Afeganistão) pode impressionar os outros. O que uma parte do mundo vê, é que tem trocado seus bens, as matérias-primas, os produtos, agrícolas ou industriais, resultantes do trabalho dos seus povos, por «bilhetes verdes», que possuem cada vez menor poder de compra. Ou seja, os povos e seus governos, começam a tomar consciência de que estão a ser duplamente esbulhados das suas riquezas.

A confiança já não existe. Isto não é de agora. Pelo menos, desde as brutais guerras no início deste século, já ninguém - aliados inclusive - confia nos EUA. Ninguém acredita na bondade e sinceridade dos EUA, como sistema económico, ou como parceiro geoestratégico. É notório como - repetidas vezes - eles deixam cair aliados que já não lhes interessam. Sem confiança, não há possibilidade de comércio, de intercâmbio e de cooperação. Sem confiança, não existe motivação para um país prescindir de medidas de soberania, como taxas alfandegárias, etc. que protegem da concorrência internacional os bens produzidos pelas indústrias nacionais respetivas.

Ficam apenas a força bruta imperial, a intimidação, a chantagem, a criação do medo nos povos e nos seus dirigentes. Cedo ou tarde, a mudança surgirá. Mesmo no interior dos EUA, já existe um número elevado de pessoas conscientes de que o sistema está viciado contra elas, contra as pessoas não-privilegiadas.

Historicamente, o ouro foi e continua a ser visto como metal monetário. Por isso, os bancos centrais de diversos países têm conservado o seu ouro e, mesmo, nos últimos anos têm aumentado significativamente suas reservas. O ouro é tangível, é muito estável, tem propriedades físicas que o tornam realmente o mais apropriado para servir como reserva de valor. Em todo o mundo, é reconhecido e, em todas as áreas da indústria (não apenas na joalharia), existem aplicações para o ouro. 
Uma grande crise poderá destruir divisas, mesmo as tidas como fortes e também as criptomoedas, num instante. Num instante igualmente, todos os ativos financeiros denominados em dólares, euros, yen, libras, yuan, etc, ficarão a valer zero, ou próximo disso. 
O imobiliário, estando hipervalorizado, sofrerá uma quebra brutal, mas os edifícios permanecerão, somente o seu valor de mercado ficará muito diminuído, especialmente numa crise profunda, arrastando-se por muitos anos. 
Os objetos valiosos, como peças de coleção ou peças de arte, ficarão, não serão destruídos, mas -também aqui- será difícil conseguir, no curto prazo, obter algo equivalente (em valor real) ao que pagou na compra.
Restam os metais monetários, a prata e o ouro, que podem ser guardados e transportados em quantidades pequenas, de forma discreta. Num primeiro tempo, poderão sofrer um abalo, no momento em que a estrutura financeira ruir, mas - em breve - serão ainda mais preciosos e úteis, face à perda total de confiança no papel-moeda e com a provável imposição de cripto-moedas estatais, como única forma de pagamento.
O ouro, considero-o a única reserva de valor nas mãos dos cidadãos, que está segura e que talvez volte a ser um meio de pagamento corrente. Foi assim no passado. Não faz sentido comparar o risco de se possuir ouro**, com o de possuir criptomoedas, que podem ser criminalizadas pelos Estados (veja-se o caso recente da China) ou hackeadas; estão constantemente a surgir notícias de golpes nos «porta moedas» (wallets), ou os centros de câmbio (exchanges).
-------------------------

(*) Janet Yellen: “The US has never defaulted. Not once.”

“Doing so would likely precipitate a historic financial crisis,” Yellen wrote. “Default could trigger a spike in interest rates, a steep drop in stock prices and other financial turmoil.”

(**) O ouro foi sempre o melhor meio de conservar valor ao longo do tempo. Isto tem sido verdade ao longo de 5000 anos. Por isso, devíamos todos avaliar o preço das coisas em peso de ouro, e não em euros, dólares, ou outra divisa «fiat». Por exemplo, um «Big Mac» em dólares, custava cerca de 60 cêntimos, quando Nixon despegou o dólar do ouro, em 1971. Agora, o mesmo «Big Mac» custa 4 $: Isto corresponde à perda de 85% do valor do dólar. Faz ainda mais sentido avaliar bens tais como propriedade imobiliária, carros, etc. em onças ou gramas de ouro, comparando o preço atual, com o preço ao longo dos anos. Assim, podemos ver qual a evolução real dos preços, porque eliminamos a contínua desvalorização das divisas «fiat».  A inflação, maior ou menor, das divisas «fiat» ao longo do tempo, não nos permite usá-las para uma avaliação acertada, porque um dado valor em «dólares constantes» ou noutra divisa, pressupõe que a inflação cumulada foi rigorosamente medida. Sabemos que isso não é assim. Sem dúvida, que os índices de inflação têm sido estimados (muito) abaixo da realidade.

terça-feira, 7 de setembro de 2021

DESTRUIÇÃO SISTEMÁTICA DAS POUPANÇAS, SALÁRIOS E PENSÕES

Quando as pessoas ouvem falar do «Great Reset» ou «Grande Reiniciação», pensam, geralmente, como algo que acontecerá no futuro. Além disso, a média dá notícias, como se incidisse «apenas» sobre os grandes acordos monetários, um «Bretton Woods II», algo que se passaria longe da economia do dia-a-dia, da nossa vida. Mas, na verdade, isto é um truque dos poderosos, com a conivência da média económica.

Vou tentar explicar claramente por que razão...
(a) o «Great Reset» está em curso e em fase adiantada
(b) isso tem tudo a ver com nossas vidas pessoais (pensões, ordenados, poupanças, contas bancárias)
(c) o completar do plano - com a total digitalização das divisas - equivale à nossa transformação em servos da gleba face aos senhores feudais globalistas.

Mas comecemos pelo princípio: O sistema de Bretton Woods, o sistema monetário instaurado em 1944, assumia-se ancorado ao padrão-ouro, mas esse ouro só podia ser remido de um banco central para outro banco central. O dólar US funcionava como moeda de reserva, tendo uma paridade fixa (35 dólares /onça de ouro troy) e todas as restantes divisas iriam ter indiretamente ligação ao ouro, através da cotação ao dólar.

Em 1971, há meio século, Nixon fez uma mudança, instigado pelos seus conselheiros, vendo a dívida dos EUA aumentar, pelo lançamento, alguns anos antes, de ambiciosos programas sociais pela administração Johnson e pela intensificação da guerra do Vietnam, a qual absorvia, além de muitos americanos jovens (criação do serviço militar obrigatório), quantidades enormes de dólares para alimentar a máquina de guerra. Por outro lado, os parceiros dos EUA estavam cada vez mais suspeitosos da sua solvabilidade e da cobertura em ouro do dólar. Eles tinham adotado a prudente estratégia de pedir que os dólares em excesso nos cofres dos seus bancos centrais fossem remidos em ouro. Isso aconteceu, nomeadamente, com a França e com a Grã-Bretanha. A declaração de Nixon, a 15 de Agosto de 1971, decretando a não convertibilidade «provisória» do dólar em ouro, foi de facto, um incumprimento contratual («default») pelo Estado que tinha sido o principal arquiteto (e beneficiário) do sistema instaurado em Bretton Woods.

O resultado deste estado de coisas arrasta-se até hoje, em que não apenas o dólar, como todas as divisas, em todo o mundo, são mantidas numa «paridade flutuante». As cotações são baseadas na «confiança» nos respetivos governos. É o significado do nome latino «fiat». Em bom português, as divisas têm como fundamento o sopro do vento, o ar.

O sistema passou - em 1971 - a ser baseado, exclusivamente, no crédito. Se um determinado governo e, por extensão, o respetivo banco central, «merecem confiança» dos investidores, estes não terão problemas em emprestar-lhes dinheiro (comprando obrigações, ou bilhetes do tesouro). As obrigações do tesouro desse país deveriam teoricamente dar um juro suficiente para atrair os investidores. O juro remunera o tempo em que o título (a obrigação, ou outro instrumento de crédito), está em dívida, para compensar o investidor que emprestou o dinheiro. Porém, se houver desconfiança quanto à solvabilidade daquele Estado, ou sua vontade em restituir o dinheiro emprestado, os juros subirão na proporção dessa desconfiança.

O sistema monetário baseado no crédito tem como pilar fundamental os bancos centrais, que emitem divisas (notas de banco ou equivalente eletrónico), para cobrir as emissões de dívida dos respetivos Estados. Se não houvesse a participação dos bancos centrais nos leilões da dívida dos Estados, esta teria - com certeza - um juro mais alto. Há cerca de dez anos, os leilões de dívida dos «PIIGS» passaram a ser cobertos regularmente pelo Banco Central Europeu, de tal maneira que aqueles têm conseguido colocar a dívida apesar dos juros ridículos, iguais ou mais baixos que as emissões de dívida dos EUA ou doutros Estados, muito mais sólidos que os países do Sul da UE (que essa perceção de solidez seja certa ou errada, não está em discussão, aqui).

A distorção permanente do valor do dinheiro (1), ou seja dos juros da dívida, tem consequências. Note-se que todo o dinheiro é «fiat»: Neste sistema, o dinheiro, não é mais do que dívida.

Uma grave consequência disto, é a perda de poder aquisitivo das pensões. Com efeito, o sistema de pensões está baseado no princípio de se dar na fase ativa profissional, para se reaver através de uma pensão, uma quantia fixa, recebida quando, por idade ou por deficiência, já não se pode trabalhar.

Ora, as pensões são atacadas de duas maneiras: uma, pela perda do poder de compra do dinheiro. Se os objetivos de inflação de 2% anuais do BCE ou da FED fossem cumpridos (2), as pessoas reformadas perderiam em 10 anos, pelo menos 20% ou mais, em poder de compra da sua pensão, o que não é nada trivial. Estas pensões quase nunca são aumentadas e quando o são, os aumentos são tardios e insuficientes para cobrir a perda de poder de compra.
Outra forma de ataque, deve-se ao facto dos fundos de pensões terem dificuldade em obter a rentabilidade mínima para se (auto)sustentarem no longo prazo, devido à descida radical dos juros. Esta descida incita os fundos de pensões a aumentarem, cada vez mais, a proporção de investimentos especulativos (bolsa, etc.), arriscando no casino financeiro as garantias de pagamento das pensões.
Quanto aos salários: Em teoria, os trabalhadores podem, mediante lutas reivindicativas, conquistar melhorias salariais. Isto, porém, não existe hoje, em múltiplas situações, porque as pessoas são sujeitas a emprego precário, a repressão das atividades sindicais é uma realidade e devido a outras circunstâncias, os salários reais (em termos do seu poder de compra) têm diminuído.

Mas, todo o dinheiro é crédito. Quando as pessoas pedem um crédito ao banco, para compra de uma casa, por exemplo, este dinheiro é escriturário: ou seja, o banco inscreve determinada soma na conta bancária do cliente e este fica a dever-lhe prestações mensais mais os juros, durante o tempo do contrato. O dinheiro não existia antes, não foi retirado da conta doutros clientes, ou dum fundo pertencendo ao banco. Foi criado «ex-nihilo». Aliás, a maior parte do dinheiro em circulação é gerado desta forma.
O dinheiro que os devedores do banco pedem emprestado, deve considerar-se uma ficção, em última análise. Mas, TAL NÃO É O CASO do dinheiro gerado pelas atividades económicas dos mesmos clientes. Foram estas atividades que permitiram que eles tivessem um excedente (sobre a satisfação de suas necessidades imediatas) e, com ele, pagassem as prestações. Digo que não é o caso, pois esse dinheiro foi gerado em retribuição de trabalho (e mesmo se foi de rendimentos, indiretamente resulta do trabalho de alguém).
Portanto, o dinheiro real (resultante da atividade económica) serviu para extinguir a dívida contraída junto do banco, mas essa dívida constituiu-se com CAPITAL FICTÍCIO.
Aliás, a prova disso é que quando a dívida se extingue, esse dinheiro também se extingue. No fundo, o que o banco esteve a fazer, foi trazer para o horizonte temporal do presente, a soma necessária ao cliente para obter determinado bem material (uma casa, neste exemplo), sendo essa soma paga num intervalo de tempo, com a taxa de juro calculada, tendo em conta a desvalorização do dinheiro nesse intervalo de tempo, mais a remuneração (lucro) do banco.

Visto que tudo funciona com base no crédito, os juros de referência dos bancos centrais tornam-se ainda mais importantes, pois servem para determinar os restantes juros. São também importantes para avaliar a rentabilidade do capital investido.
Ora, a mais ostensiva falsificação do valor do dinheiro «fiat», começa com as catadupas que foram vertidas a partir de 2008 no sistema financeiro, sobretudo nos bancos ditos 'sistémicos', para estes não colapsarem, mas sem qualquer contrapartida. Estes bancos não investiram na economia, não emprestaram para realizar investimentos produtivos, o que teria um efeito multiplicador. Preferiram manter o dinheiro em contas, que eles detêm nos próprios bancos centrais (contas onde guardam os excessos de reservas), recebendo um juro minúsculo, mas seguro. Alternativamente, emprestaram a grandes empresas tecnológicas (Google, IBM, Apple, etc., etc.) e outros gigantes que, por seu turno, usaram este crédito muito barato para auto-compra das ações. Desta forma, aumentam a cotação bolsista das suas próprias empresas e arrastam os especuladores a comprar essas ações.

Na base da bolha enorme, que se observa em todas as grandes bolsas mundiais, estão - sem dúvida - os bancos centrais e sua deliberada estratégia. A teoria (falaciosa) deles, é de que isso dá aos indivíduos uma perceção subjetiva duma economia a funcionar bem, o que os iria encorajar a investir e a consumir.
Esta conversa já não nos deveria enganar, pois:
- Primeiro, muitas pessoas ignoram completamente, ou veem de longe o mercado de ações;
- Segundo, os investidores normais não têm acesso a créditos com juros de favor, que as grandes empresas obtêm para jogar na bolsa. Para o comum dos mortais, as taxas de juro, de empréstimos para estes ou outros fins, estão longe de ser próximas de zero;
- Terceiro, as pessoas (já) não têm capital disponível para investir em bolsa, pelo menos de um modo significativo, pois os salários perderam muito do seu poder de compra, nestes últimos 30 anos. Por esse motivo, aliás, cada vez mais compram a crédito bens de consumo, estudos, ou férias, que dantes pagavam a pronto, ou com as pequenas poupanças que faziam.

A destruição do valor das divisas fiat, é uma estratégia deliberada dos governos e bancos centrais, para minorar a enorme dívida que se acumulou:
Primeiro, houve a crise de 2008, depois a continuidade da economia deficitária, mas convenientemente ocultada e, finalmente, a chamada «crise do COVID», que veio mesmo no tempo exato, ocultar a disfunção no coração do sistema, nomeadamente, o financiamento interbancário (o «Repo market»).
A partir de Março de 2020, os bancos centrais têm vindo a acelerar a impressão monetária, a um ritmo tal, que será impossível qualquer «atenuação». Basta pensar no que aconteceu em dezembro de 2018, após alguns meses de redução (apenas redução!) dessa impressão monetária. A FED teve de inverter completamente a sua política, sob pena duma crise, financeira e monetária, rebentar com efeitos brutais na economia real.
Foi exatamente o que se passou em Março de 2020, mas numa escala ainda maior. O discurso sobre futura redução do caudal («tapering») é para adormecer os incautos e para satisfazer os governos, que também precisam de adormecer seus eleitores.
De facto, os bancos centrais preparam-se para a destruição final do dinheiro «fiat». Estão ativamente a preparar o lançamento de «criptomoedas», centralizadas, por eles produzidas e controladas. Nessa altura, a digitalização do dinheiro será completa. Não será possível comprar um objeto ou serviço, com dinheiro-papel. O dinheiro-papel poderá ficar como objeto de coleção, tal como certas emissões de selos de correio, somente compradas por filatelistas, ou moedas em ouro ou prata, para os numismatas colecionarem.

Interessa à oligarquia e aos governos que as pessoas guardem o dinheiro inteiramente à mercê deles, nas suas contas eletrónicas. Elas não poderão fazer sair esse dinheiro, senão gastando-o. Mas, qualquer gasto terá a «impressão digital» indelével, pelo que tudo o que fizermos estará totalmente sob escrutínio das grandes corporações e dos Estados.

Além disso, podem estes sistemas de dinheiro 100% digital, aumentar a eficácia da coleta de impostos (sobretudo dos nossos, não os dos muito ricos). Não havendo possibilidade de fuga aos impostos, haverá uma punção periódica, calculada em função dos parâmetros do teu rendimento e do teu consumo.
Por fim, os bancos comerciais poderão cobrar taxas sobre os depósitos. Estaremos sujeitos à sua chantagem permanente. Note-se que as pessoas não terão opção: Hoje em dia, podes pagar em dinheiro físico qualquer coisa. Isso não é ilegal, nem sequer é suspeito. De futuro, as possibilidades de fazeres o que entenderes com o teu dinheiro ficarão limitadas. E, não se trata de atividades ilícitas, mas de atividades do dia-a-dia. De futuro, mesmo pequenas despesas deixarão de estar fora do escrutínio dos sistemas de Inteligência Artificial e dos que detêm o controlo sobre os mesmos.

Estamos perante perigos reais para a nossa autodeterminação, privacidade, possibilidades de escolha, para a liberdade dos indivíduos. Além disso, ninguém pode saber em que mãos esses tais sistemas podem ir parar, no futuro. Os sistemas de pagamento digitais centralizados têm demasiados inconvenientes para as pessoas comuns, mas são imensamente úteis para a oligarquia que tudo domina.

-------------------
(1) «Os juros negativos são uma aberração. São uma tomada de reféns. Se toda a gente pudesse obter empréstimos com juros negativos, o Euro seria imediatamente destruído.» (da newsletter de Guy de la Fortelle «L'Investisseur Sans Costume»)

(2) Ver inflação real, calculada por John Williams, Shadowstats.com

sábado, 16 de maio de 2020

A PRESENTE EXPANSÃO MONETÁRIA E O SEU PREVISÍVEL RESULTADO

                            Final Currency Debasement to Zero Has Started | GoldBroker.com

Em consequência da crise artificialmente desencadeada com a paragem - por ordem dos governos do Ocidente - de metade da produção mundial, temos agora que enfrentar a crise económica mais profunda, desde a grande depressão de 1929-1934. 
O resultado da crise, que agora apenas começou e que irá durar provavelmente uma década ou mais, não será fácil de antecipar nos planos social e político
Embora seja certa - desde já - uma quebra dos padrões de bem-estar e de riqueza, mesmo nos países ocidentais outrora afluentes, as agitações sociais, causadas pelo empobrecimento brusco de grande parte da classe média, são imprevisíveis. 
Mas, o meu propósito - neste artigo - é enfatizar as consequências directas das políticas económicas dos governos, apoiados pelos respectivos bancos centrais.  
A expansão extraordinária da massa monetária, levada a cabo pela FED, o banco central dos EUA, e imitada pelos outros bancos centrais, tem consequências aparentes e ocultas. 
Quanto às consequências aparentes, pode-se constatar a obtenção de meios monetários praticamente ilimitados pelos Estados, para fornecer apoios extra em muitas direcções:
- aos trabalhadores e às famílias, que ficaram - de repente - sem recursos (o chamado «dinheiro de helicóptero») 
- às empresas de pequena e média dimensão, salvas da falência, graças ao crédito concedido pela banca. Mas, este crédito somente é concedido porque está garantido pelo erário público.
- aos bancos, em situação real de falência, com balanços cada vez mais negativos, à medida que a crise se vai avolumando: mais e mais devedores deixarão de pagar suas prestações hipotecárias, simultaneamente com a desvalorização do que foi dado em garantia dos empréstimos, etc...
- aos Estados, através da compra sistemática das suas emissões de dívida. Este financiamento dos Estados pelos bancos centrais, embora anátema face à ordem neoliberal, é hoje praticado pelos mesmos neoliberais.
Esta aceleração do crédito e da emissão monetária, está a causar uma expansão brutal dos activos da  FED, emissora do dólar, principal moeda de reserva mundial e das trocas comerciais.  A FED troca dinheiro líquido pelas mais diversas «garantias», incluindo agora «junk bonds» (obrigações cuja segurança é considerada abaixo do limiar de investimento). Apenas no espaço de um ano, estima-se em 62% a expansão dos activos da FED.  
O mesmo se passa com outros bancos centrais. Esta situação equivale à «nacionalização» de grande parte da economia, mas sem que exista um verdadeiro controlo e pilotagem, por parte dos governos respectivos. Vão ser os bancos centrais a decidir, na prática, as políticas concretas dos Estados e dos governos. Note-se que coloquei «nacionalização» entre aspas, pois os bancos centrais, da maior parte dos países ocidentais, são privados: é o caso da FED, do Bank of England, do ECB, etc.; são conglomerados de entidades bancárias privadas que detêm o controlo. Existe uma supervisão dos Estados, mas sem a possibilidade destes decidirem sobre as políticas monetárias.  

O que descrevi acima, pode deixar indiferente alguns, que não percebem o alcance destas mudanças, porém, as suas consequências serão muito amargas para todos. 

De entre as consequências ocultas, a mais preocupante, é uma inflação descontrolada. A inflação não poderá ser contida, como até agora. Ela não se confinará aos mercados financeiros, às acções, obrigações e produtos financeiros derivados. 
Outra consequência oculta, é a destruição do valor real das divisas (do seu poder de compra), que se vai acelerar. 
Só poderá tirar benefício desta situação, neste contexto, uma pequena minoria, que detém bens duradoiros, com potencial para gerar rendimento:
- terra agrícola, imobiliário, ou as poucas empresas rentáveis, apesar da depressão que aí vem. 
Mesmo dentro de cada categoria de activos, será necessário diferenciar: por exemplo, o imobiliário comercial não será rentável, neste contexto; talvez apenas poderá sê-lo no médio-longo prazo.
A destruição do valor das divisas obrigará à reestruturação da ordem monetária existente. 
Haverá que estabelecer, num ponto ou noutro do futuro, um acordo global entre as diversas potências, algo equivalente a um novo «Bretton Woods».
Mas ninguém pode, hoje, saber quais os resultados desse futuro «Bretton Woods». No entanto, existem numerosos indícios de que se chegou ao fim do ciclo do domínio mundial pelo Ocidente, com os EUA à cabeça. 

É um caso de «suicídio» civilizacional: estamos a presenciar o resultado conjugado da ilusão decorrente da «hubris», da arrogância e da ganância da oligarquia, da sua miopia política, da demagogia...
Os povos dos países ocidentais não têm responsabilidade directa, embora tenham caído na ilusão de que podiam «decidir pelo voto» as políticas dos Estados e governos respectivos. 
Serão os «de baixo» a pagar o custo - pesado e amargo - dos desmandos da oligarquia estúpida e corrupta que os explora. Esta, tudo fará para continuar como o parasita que suga o sangue do hospedeiro, mesmo enfraquecendo-o ao ponto de o matar...

quinta-feira, 3 de setembro de 2020

PETER SCHIFF «Por que razão a promessa de inflação da FED faz subir o preço do ouro»

 


Uma lição clara e concisa!

Peter Schiff é o CEO duma empresa de investimento «Euro Pacific Capital». Ele começa pela análise da subida muito enérgica do ouro. Ele recua no tempo até à decisão de Nixon de 1971, de retirar o dólar da indexação ao ouro (35 USD /onça de ouro) fazendo com que o sistema de Bretton Woods ficasse sem base. Antes da decisão de Nixon, era possível trocar (ao nível dos bancos centrais) os dólares - que estes detivessem em excesso nas suas reservas - por ouro àquela taxa.

A inflação que ocorreu nos anos 70 e até Paul Volker (o presidente da FED durante a presidência de Ronald Reagan) nos início dos anos 80, fez com que o ouro subisse de 35 dólares a mais de 800 dólares a onça, em menos de uma década.

Seguiu-se um período em que a inflação foi severamente reprimida, com imenso custo social. Neste período, o ouro iniciou uma longa fase de descida que atingiu seu mínimo por volta do ano 2000. Após esta fase, a subida do ouro -  muito lenta, primeiro e rápida depois  - culminou com a cotação de cerca de 1900 dólares / onça (em 2011). 

No entanto, os bancos centrais ocidentais, em conjunção com os grandes bancos que negoceiam no mercado do ouro, têm-se coligado para suprimir a subida do ouro, pois iria mostrar a rapidez da desvalorização das divisas, a começar pelo dólar, a divisa de reserva desde Bretton Woods (1944). 

Mas, eles não têm escolha, senão deixar o ouro subir substancialmente, mas ainda assim, muito abaixo do valor que corresponderia à relação ouro /divisas. 

Com efeito, o ouro total teoricamente disponível nos cofres dos bancos centrais, dos bancos comerciais, de particulares, etc., se correspondesse ao total de divisas «fiat» em circulação, ao nível mundial, segundo os cálculos de especialistas, teria um preço de cerca de 10 mil a 20 mil dólares por onça.  É preciso notar que o poder aquisitivo das divisas (a começar pelo dólar) tem diminuído exponencialmente, sendo de cerca de 2-3% DO PODER AQUISITIVO, na primeira ou na segunda década do século XX.

A inflação é uma coisa má; Peter Schiff explica porquê. Ele recorda que Warren Buffett está consciente que esse imposto escondido - que é a inflação - vai afectar os seus investimentos, razão pela qual decidiu vender acções de empresas tecnológicas e investir substancialmente nas melhores empresas mineiras de ouro.

Ele explica porque razão o mundo está a ficar inundado em «dinheiro falso», ou seja, o aumento desproporcionado da massa monetária em relação à economia produtiva. O efeito é, necessariamente, uma espiral da inflação. Não admira, portanto, que o ouro tenha ultrapassado recentemente a cotação máxima de 1900 dólares/onça, atingindo cotações que se aproximam de 2000 dólares /onça.  

Defende que o ouro voltará - num certo momento - a ser  o garante do valor das diversas divisas. Diz que está a verificar-se o início dessa viragem, o que se pode observar pelo sentimento cada vez mais favorável em relação ao ouro. Nos últimos dois anos, verificou-se uma procura - cada vez maior- deste metal precioso, nos mercados.  O ouro é um garante contra a perda de valor dos activos, num contexto de aumento da inflação. Esta, deve-se à impressão monetária dos bancos centrais. Todos os analistas dos mercados estão seguros de que ela vai acelerar. Com efeito, Jerome Powell, o presidente da FED, prometeu de que irá permitir que a inflação suba, para além do objectivo (anterior) de 2%.

NB: O vídeo de Lynette Zang é um bom complemento para aprofundar este tema.

domingo, 13 de agosto de 2023

CUIDADO COM O GRANDE AFROUXAMENTO - Alasdair Macleod

Alasdair Macleod - como analista económico e dos mercados dos metais preciosos - limita-se a discorrer dentro dos parâmetros de evidências relacionadas com  todos os elementos quantitativos e as tendências que se afirmam no domínio financeiro, das moedas e das cotações de metais preciosos. Ele tem razão em assim proceder, pois é a única maneira de fundamentar - de forma impecável - os fenómenos complexos e caóticos, como são os assuntos humanos, mormente na política e economia.

Mas, para dar «substância» concreta ou «carne», a estes gráficos e tabelas de números,  basta pensarmos na Grande Depressão e as suas consequências: um empobrecimento geral, a dissolução das «garantias» dadas (supostamente) pelos Estados aos seus cidadãos, a ascensão de políticos autoritários e belicosos à chefia de Estados, a IIª Guerra Mundial, antecedida por um cortejo de guerras preparatórias (guerra de Abissínia, Guerra Civil Espanhola, a guerra civil e invasão japonesa da China...).  Tudo isto foi consequência do colapso económico-financeiro de 1929 e dos anos seguintes. O Mundo só deixou de estar em depressão (após uma década), com a transformação dos países industrializados em economias de guerra, nomeadamente nos EUA. 

Pense-se em todo o sofrimento humano, no passado e agora... Basta olhar à volta, com olhos de ver.


https://www.goldmoney.com/research/beware-the-great-unwind



This chart strongly suggests that US Treasury bond yields, widely regarded as the risk-free yardstick against which all other credit is measured are going significantly higher, not stabilising close to current levels before going lower as commonly believed. I conclude that US Treasury bond yields could easily double, and the political class will be powerless to stop them going even higher. The implications for interest rates globally are that they will be forced considerably higher as well.

This article concludes that reasoned analysis takes us to this inevitable conclusion. It is consistent with the end of the post Bretton Woods fiat currency era, and the return to credit backed by real values.

The collapse of unbacked credit’s value was only a matter of time, which is now rapidly approaching. The Great Unwind is under way. It is the consequence of monetary and currency distortions which have accumulated since the end of Bretton Woods fifty-two years ago. It will not be a trivial matter.

The trigger will be capital flows leaving the dollar, creating a funding crisis for the US Government. Foreigners, who have accumulated $32 trillion in deposits and other dollar-denominated financial assets will no longer need to maintain dollar balances to the same extent, perhaps even paring them back to a minimum. Furthermore, economic factors are turning sharply negative with energy prices rising ahead of the Northern Hemisphere winter, springing debt traps on western alliance governments. So how could bond yields possibly decline materially in the coming months?

 - Continuação do artigo de Macleod, em inglês AQUI

sábado, 17 de outubro de 2020

O COIOTE CAI NO PRECIPÍCIO...

Certas pessoas, auto-designadas especialistas em economia e em tudo o mais, utilizam sempre o futuro condicional, para descrever qualquer cenário que apresentem. Têm de inspirar receio e, ao mesmo tempo, incerteza. Por isso dizem: «a crise virá, se ...». Falam sempre no futuro condicional.
Ora, no mundo económico - como no dia-a-dia corrente - as coisas são ou não são. Aqui, não há "gato de Schrödinger"(1).
A economia mundial está numa rota irreversível de ruptura, depressão, crise sistémica, ou não está. Se não está, existe a possibilidade, mesmo que remota, de evitar o pior ... Mas, se é mesmo uma crise estrutural, sistémica, não há forças, por mais poderosas, que possam reverter esta situação (2). 

                                    
                              Coiote Wile E. caindo num precipício

Há quem esteja ainda na ilusão, porque estamos no início da queda, como o coiote, que fica por um instante em suspensão no vazio e, quando olha para baixo e vê que não existe solo a sustentá-lo, inicia a sua descida a pique no precipício, até se estatelar lá no fundo, com um estrondo...
Os mercados especulativos experimentam euforia, pedalando no vazio - como o coiote - muito felizes(3) por estarem em subida, quando - na verdade - se assiste à queda generalizada do valor de todas as divisas,  ao esvaziamento de seu valor remanescente. 
Mas, num dado momento, é inevitável as pessoas se aperceberem de que não resta qualquer valor nos bocados de papel, quer sejam de dinheiro líquido (cash), acções, obrigações, derivados, ou de outro produto financeiro.  Por essa altura, a crise vai agravar-se, haverá «crashes» e falências em série, a hiper- inflação vai aparecer em cena e não vai ser uma cena boa. 
Este cenário não é condicional: Não é no caso da economia continuar a degradar-se. Pois ele já está inscrito no presente, já está traçado na realidade crua da economia e finança mundiais. 
Poucas pessoas sabem, ou suspeitam sequer, da iminência de uma mudança das "regras do jogo" (4). Provavelmente, irão anunciar as tais mudanças a posteriori, depois de as terem efectuado, reprogramando os computadores num fim-de-semana, como se fosse tudo muito simples e banal. Entretanto, os bancos comerciais, os fundos especulativos, as grandes fortunas, que foram avisados há muito tempo, já tomaram medidas, para que não haja consequências nefastas para eles.
É a realidade das forças a ditar o rumo das coisas. Como a força da gravidade, que faz com que o coiote caia pelo precipício abaixo ...

NB: tudo indica que os poderes globalistas, sob a batuta do FMI, estão a negociar agora  «um novo Bretton Woods». Veja:

https://www.imf.org/en/News/Articles/2020/10/15/sp101520-a-new-bretton-woods-moment


https://www.imf.org/external/mmedia/view.aspx?vid=6200738336001


------

(1) O gato de Schrödinger é um gato que este físico imaginou para explicar que - segundo a teoria quântica - um objecto podia estar num estado ou noutro («gato vivo ou gato morto»), em simultâneo. O estado do objecto apenas se concretizava quando o experimentador o observasse.

(2) A não ser que...  laboratórios e  cientistas dos mais avançados, tenham encontrado o processo de reverter o tempo e possam ir, em sucessivos pontos do passado, corrigir os erros cometidos por uns e por outros, e depois regressar ao tempo presente. Isto é uma demonstração pelo absurdo.

(3) Entretanto, os manipuladores não hesitam usar stars da pornografia para convencer as pessoas a jogar na bolsa.

(4) Por exemplo, a transformação de todos os contratos indexados ao LIBOR. Porquê? porque este índice foi de tal maneira manipulado pelo pequeno grupo de grandes bancos que o estabelecia, que as entidades de supervisão decidiram acabar com ele em 2021. Esta transformação vai implicar mudanças... 


segunda-feira, 3 de julho de 2017

O QATAR E O FIM DO PETRO-DÓLAR

                      

Esqueçam tudo o que sabem sobre o Médio-Oriente, ou melhor, tudo o que julgam saber, visto que temos estado literalmente a sofrer sucessivas lavagens ao cérebro, acerca das guerras na bacia do Mediterrâneo e no Oriente-médio.

Com efeito, os media apresentam sempre a grelha de leitura do conflito religioso, na sua vertente sectária, entre muçulmanos xiitas e sunitas. Nada é mais falso do que esta leitura «confessional» para explicar o fundamento profundo destas guerras. 

É preciso realmente recuar a 1971 e ao repúdio de Bretton Woods pelos EUA, a superpotência sob cuja égide foram firmados estes acordos. Do repúdio unilateral de Bretton Woods nasceu o petrodólar, resultante do acordo da monarquia saudita com Kissinger em só aceitar dólares em pagamento do petróleo contra uma proteção total pelo exército dos EUA. 

Só assim se compreenderá que a batalha que se trava é económica e financeira antes de mais; que envolve parcerias estratégicas para controlar os mercados estratégicos de «ouro negro» (petróleo e gás natural) e do ouro, propriamente dito. 

Finalmente, para se possuir uma perspetiva realista sobre a reorganização do mundo ao nível do padrão monetário, o chamado «reset», teremos que compreender o seguinte: quem controlar os fluxos de capitais, controlará o futuro, ora o capital real não é o dólar, ou petrodólar ou euro dólar, mas antes as matérias primas estratégicas, nomeadamente e em primeiro lugar os combustíveis fósseis, assim como o ouro, o valor de reserva em última instância.

Quem quiser perceber algo das lutas, das guerras, dos terrorismos, terá de se distanciar das narrativas dos media de «referência». Só fazendo uma pesquisa individual poderá adquirir algum saber, para além do ecrã de propaganda. Só quem puder ou souber manter-se ao corrente da situação, diversificando as suas fontes, poderá construir sua visão geral de geoestratégia e de política.

Os artigos de Shaun Bradley («O fim do petro-dólar, o que a FED não quer que você saiba») e de Ahmed Charai («A única saída para a crise do Qatar) têm aspetos criticáveis, enunciam as opiniões dos respetivos autores, mas eu aconselho a sua leitura integral e atenta, pois estão recheados de informações preciosas, as quais são sonegadas ou cujo significado é sistematicamente obscurecido pela comunicação social de massa. 

A crise entre o Qatar e os outros países do Conselho do Golfo (formada pela Arábia Saudita e os Emirados) é reveladora da transição para fora do petrodólar e da perda de hegemonia dos EUA. 

Neste gigantesco jogo de tronos ... as populações, principalmente os civis inocentes, são as grandes vítimas.

Mas também estamos a assistir a isto tudo, porque a «nação excepcional» e seus aliados europeus, decidiu - há muito tempo - que as políticas focalizadas nos «direitos humanos» só se aplicavam a países de Leste e à Rússia (ou à União Soviética). Apenas usadas como arma de contra-propaganda ao «comunismo e socialismo» (ou, mais precisamente a quaisquer alternativas populares, mesmo as mais reformistas...). 

Quanto às monarquias do Golfo, cada qual mais reacionária que a outra, completamente corrompidas, tinham de ser acarinhadas por «realismo político». Aqui, pouco importava elas não serem propriamente modelos de virtudes humanitárias (veja-se a guerra contra os civis no Iemen, largamente ignorada, veja-se a guerra por procuração, contra um dos poucos regimes laicos, o sírio...). 

Mas, como mostra a crise dos países do Golfo com o Qatar, chegou o momento de certos aliados mudarem de campo, o que acontece também com a Turquia. Por outras palavras, a grande mudança, o «reset», está a desenrolar-se diante dos nossos olhos. 

Quem não observar as coisas tal como elas são, irá fatalmente tomar decisões erróneas, a todos os níveis, porque irá considerar como sólido aquilo que se está a desmoronar, irá investir em miragens, para ficar com uma «mão cheia de nada». 

Tanto no plano financeiro, como no sentido de «investimento emocional», as pessoas deveriam questionar - antes que seja tarde demais - as suas certezas. Aquilo que tomam como «dado adquirido» resulta - muitas vezes - da perpétua propaganda que se abate sobre todos nós. 

Quem ler os dois artigos supra-citados e os comparar com a narrativa que nos é constantemente vendida nos media, terá um elemento comparativo e de avaliação. Não me parece exagero dizer que temos estado sujeitos a endoutrinamento, neste assunto, como em muitos outros. 
Infelizmente, isso acontece um pouco por todo o mundo, talvez mais maciçamente nos países onde o nível cultural geral é baixo. Mas, onde o público é mais sofisticado, a mentira também o é! 

sexta-feira, 9 de setembro de 2022

CRÓNICA (nº7) DA III GUERRA MUNDIAL - A EMERGÊNCIA DE UM NOVO PADRÃO MONETÁRIO

                                                              
                                                       Bolsa do Ouro em Xangai


Antes de mais nada, devo especificar que o meu papel, a minha função, é sobretudo de refletir sobre o que se passa à minha volta e no mundo. Não é de fazer propaganda ou de «fazer claque» por um dos lados, enaltecendo as virtudes de uns e denunciando os podres de outros.
Como testemunho interessado (pois vivo neste mundo, não num mundo imaginário) verifico que realmente estamos numa confrontação global de longa duração.
Sendo que este confronto é por razões bastante fundas, não se resolve portanto, senão por uma nova arquitetura global. Ou seja, que «Novo Mundo», que nova «Ordem Mundial» está aí às portas do futuro?
Este novo mundo não nos cai dos céus, resulta da ação dos homens, não apenas de chefes de estado e governo, como também dos povos e de uma multiplicidade de fatores imponderáveis, que estão sempre a brotar no quotidiano. Temos prova disso quando «grandes cataclismos» anunciados, afinal, são «nothing-burgers» e o reverso, coisas triviais que se avolumam, fazem bola de neve e transformam completamente o cenário.
Hoje, irei falar da guerra mais difícil de perceber para o comum dos mortais, a que tem a ver com a ordem financeira e monetária global. O assunto não será esotérico, em si mesmo. Não, antes é simples de se compreender, na essência.
Mas, somos impedidos de prestar atenção pela nossa mente dominada pelas notícias a cada instante, pela media que satura todos os nossos canais com lixo informativo e nos impede de tomar recuo e pensar por um lado, por outro, a des-educação em que se transformou o ensino, a todos os níveis, causando a cada vez mais visível catástrofe dos «analfabetos funcionais»: Refiro pessoas que sabem ler e escrever, que podem manipular com à-vontade o computador ou smartphone e são, no entanto, profundamente ignorantes do mundo em que vivem. A nível universitário, esta nova patologia é ainda mais conspícua, em combinação com uma autossuficiência, uma afirmação enfática de banalidades ou slogans, apresentados como «verdades eternas».
Na ordem mundial saída da II Guerra Mundial - o acordo de Bretton Woods, que reuniu as nações vencedoras (incluindo a URSS) para arquitetar uma nova ordem financeira mundial - foi muito evidente o peso e influência dos EUA. Não apenas na criação do FMI e Banco Mundial, com regras que colocam (ainda hoje) estas instituições como instrumentos dóceis do imperialismo americano, como na própria existência de uma moeda especial, o dólar dos EUA, entronizado no papel de reserva mundial, ou seja, daquela que os bancos centrais de todos os países teriam de possuir e, portanto, que teria o papel de intermediário nas transações financeiras e comerciais internacionais, não apenas de Estado para Estado, mas em transações entre bancos, para pagamentos de bens industriais, agrícolas, etc.
Esta arquitetura foi possível porque Keynes, representante do Reino Unido à conferência, não teve apoio suficiente em torno do seu projeto de «bancor», divisa que não pertenceria a um banco central nacional, pois seria um cabaz de algumas das moedas mais representativas.
Este bancor, se tivesse sido adotado, poderia desempenhar um papel estabilizador das relações monetárias internacionais, visto que a oscilação duma moeda fazendo parte do bancor, não seria suficiente para desequilibrar o conjunto, sendo certo que, quando uma divisa diminui, é sempre em relação a outra(s), que aumenta(m) (veja-se o que está a acontecer à relação dólar-euro neste momento).
No concreto, Bretton Woods assumiu que a divisa dólar (a moeda de reserva mundial) era remível por ouro a 35 dólares a onça, sendo que este valor vigorava somente nas trocas entre bancos centrais, não era um valor correlacionado diretamente com o comércio de ouro.
Assim, os países tinham a possibilidade de trocar (ao nível dos bancos centrais) seu excedente de dólares, em ouro. Mas, quando houve a guerra do Vietname, os EUA começaram ter grandes aumentos de despesas, aumentos dos défices orçamentais e muitos (entre eles, os britânicos e os franceses) decidiram começar a trocar as notas de dólar por onças de ouro, fazendo descer significativamente as reservas de ouro em Fort Knox.
Nixon, em 1971 decidiu «provisoriamente» desindexar o dólar do ouro, tendo - a partir daí - a cotação do ouro subido de 35 dólares /onça, para mais de 800 dólares / onça. Hoje (09/09/2022), situa-se em 1720 dólares /onça. Para os EUA, era vital conseguirem manter o dólar como a divisa de reserva mundial, o que lhes conferia o «exorbitante privilégio» (Giscard d'Estaing) de ter défices crónicos, no orçamento e na balança de pagamentos, sem ter severas consequências com isso, enquanto quaisquer outros países mergulhariam em crise grave.
Foi Kissinger que negociou com o então rei Saud da Arábia Saudita, o chamado acordo dos petrodólares, em 1973, pelo qual os EUA dariam proteção militar sem limites e apoio ao Reino saudita, em troca deste apenas aceitar dólares como pagamento do seu petróleo.
Como a Arábia saudita era o maior produtor de petróleo nessa altura e como tinha o controlo da OPEP, não foi difícil a norma de pagamento do petróleo só em dólares, se estender a todos os outros exportadores, incluindo países que não faziam parte da OPEP (como a URSS, por exemplo). Começou assim o reinado do petrodólar, que está agora no seu fim.
Com efeito, a Rússia e a China primeiro, mas depois também a Índia, o Irão e outros países estão de acordo e já começaram a fazer troca direta, o diferencial do comércio bilateral sendo saldado com ouro, evitando assim envolver dólares nas trocas comerciais, ou então usando as divisas nacionais respetivas nas trocas bilaterais (rublos/yuan; rupias/rublos; etc...) com o mesmo fim.
Os países da Ásia supracitados sempre consideraram que o ouro era dinheiro. Foram sobretudo os bancos centrais asiáticos que adquiriram imenso ouro, mormente quando vendido a preço de saldo (por ordem do PM britânico Gordon Brown, mas também outros países ocidentais) nas primeiras duas décadas do século XXI. Igualmente, o ouro é considerado como reserva de valor, desde tempos imemoriais, pelas pessoas em toda a Ásia, incluindo as mais modestas.
Não admira portanto que a Rússia, em pagamento dos seus combustíveis, comprados por países «não-amigos», institua a regra de que serão pagos em rublos ou em ouro. Está perfeitamente em linha com a situação de rutura final com um Ocidente cheio de arrogância e agressividade, que provocou a Rússia ao ponto desta ser obrigada desencadear uma guerra preventiva.
O aspeto caricato disto, é que os sauditas têm comprado petróleo russo (com desconto), que depois revendem ao preço de mercado aos ocidentais. O acordo dos petrodólares foi completamente virado de «cabeça para baixo»: Pois, agora, não se trata de quem venda o petróleo, ter de aceitar dólares. Agora, quem quiser petróleo, terá de se contentar com o que lhe é oferecido a um certo preço, determinado pelo vendedor!
É inevitável, com ou sem guerra da Ucrânia, que os países produtores de bens e matérias primas, que  têm produzido para os ocidentais tudo ou quase tudo o que faz o conforto das suas vidas, queiram ver-se livres da ditadura do dólar.
O SWIFT e o dólar foram transformados em arma de guerra económica, contra o Irão e uma série de outros regimes (Venezuela, Coreia do Norte, etc.). Não apenas estas sanções são ilegais, como os americanos rasgaram o princípio da territorialidade das leis, com as sanções e ameaças de sanções contra bancos ocidentais (suíços, franceses) que infringissem os embargos decretados por Washington, não por quaisquer decisões das Nações Unidas. Estes bancos tiveram de pagar pesadas multas, sob ameaça de serem impedidos de ter sucursais e de fazer negócio, de qualquer espécie, nos EUA.
O pretexto das sanções contra o Irão, foi também o que «justificou» a prisão arbitrária da vice-presidente da Huawei no Canadá, quando esta regressava duma conferência internacional na América Latina. Isto foi considerado uma afronta nacional na China.
O comportamento dos EUA em relação a todos os que não estejam completamente submissos é duma brutalidade incrível. O que fizeram ao Iraque e à Líbia, permite-nos dizer que eles são os «bullies», que usam a força bruta para intimidar e fazer valer as «leis» que eles próprios decretam, mas que não possuem validade nenhuma nos outros países, face à lei internacional.
As construções de plataformas de negociação, de trocas comerciais, de defesa e de assistência mútua têm-se multiplicado, do Mar Báltico, ao Mar da China. Os países asiáticos têm estabelecido acordos de cooperação, que incluem as Novas Rotas da Seda, uma rede de transportes fluviais, ferroviários, rodoviários, assim como portos e aeroportos. Criaram e desenvolvem bancos, destinados a financiar os grandes projetos nos seus países e nos países do Terceiro Mundo. Têm a Organização de Cooperação de Xangai, para combater o terrorismo e para encontrar soluções negociadas em diferendos. Os BRICS são uma alternativa com voz própria, ao G7 e aos atlantistas que costumavam falar em nome «da comunidade internacional», que eram eles somente, afinal de contas.
Chegou agora o momento, face ao extremismo das sanções da parte dos países da NATO, da Rússia fazer aquilo que tinha - com certeza - planeado há muito. Estou a falar da criação de uma plataforma para negociar o ouro, em Moscovo, com os seus padrões e fazendo concorrência à londrina LBMA.
O objetivo será, com certeza, fazer o que é necessário, para sanear o referido mercado. Vai impossibilitar a especulação com contratos de futuros, responsável pela manutenção da cotação do ouro, muito abaixo do que seria normal, face à queda dos ativos financeiros, a cada crise do capitalismo. Com efeito, se o público começasse a ver que o ouro é realmente um refúgio eficaz em termos de conservação de valor, ao contrário do dólar e de quaisquer outras «divisas fiat», então haveria uma corrida para adquirir ouro e a confiança no dólar-rei desfazia-se por completo. O mesmo, em relação aos ativos financeiros denominados em dólares.
Uma moeda de reserva internacional com a sustentação do ouro e de matérias primas, como metais estratégicos, petróleo e gás, é o que os parceiros Euro-asiáticos estão AGORA a negociar.
Não se enganem; se isto não é reportado no Ocidente, isto significa que É IMPORTANTE. O que é importante tem sido ocultado do público, na esperança - absurda e fútil - de que seus efeitos sejam menos severos, do que efetivamente são. É «tapar o sol com uma peneira»!

Em complemento: Leia o artigo, muito bem escrito e cheio de dados factuais, de Mcleod:

 https://www.goldmoney.com/research/an-asian-bretton-woods


---------------------

https://manuelbaneteleproprio.blogspot.com/2022/03/cronica-da-terceira-guerra-mundial.html

https://manuelbaneteleproprio.blogspot.com/2022/03/cronica-da-terceira-guerra-mundial_13.html

https://manuelbaneteleproprio.blogspot.com/2022/03/cronica-da-terceira-guerra-mundial_0396436697.html

https://manuelbaneteleproprio.blogspot.com/2022/03/cronica-da-terceira-guerra-mundial_24.html

https://manuelbaneteleproprio.blogspot.com/2022/04/cronica-da-terceira-guerra-mundial-um.html

https://manuelbaneteleproprio.blogspot.com/2022/04/cronica-da-iiimundial-guerra-biologica.html