quinta-feira, 9 de novembro de 2017

MALTHUSIANISMO E NEO-MALTHUSIANISMO

Neste curto ensaio vou desenvolver alguns aspetos da questão populacional. A biologia das populações sempre foi um domínio de que eu gostei, embora não tenha especificamente trabalhado como biólogo das populações. 
O malthusianismo, do economista inglês Thomas Malthus (1766-1834) é uma teoria que encara a população sob o duplo prisma dos recursos e da sua taxa de reprodução. Malthus postulou que os recursos - os bens necessários à subsistência humana tais como alimentos, casas, roupas, etc. - poderiam - quanto muito - progredir numa progressão linear (ou diretamente proporcional), enquanto a multiplicação dos indivíduos ocorria numa progressão geométrica ou exponencial.  Da divergência entre estes dois crescimentos, originava-se fatalmente uma escassez, que se traduzia em fomes, violências e guerra. Para evitar este terrível destino, teriam de ser tomadas medidas concretas para limitar a população (encorajamento da contraceção, esterilizações...), com vista à estabilidade populacional.
O princípio malthusiano era pessimista porque postulava que as pessoas, ao multiplicarem-se, iriam necessariamente ficar cada vez mais pobres, mais destituídas. A elite aproveitou o mesmo princípio para lutar contra a tendência para aumento dos salários e diminuição das horas de jornada de trabalho, que foram as grandes causas movimentando o proletariado, desde a primeira metade do século XIX, até hoje. 

                                     
A obra de Malthus foi utilizada por Marx e Engels assim como por Darwin, entre outros. Marx e seguidores tiraram daí o conceito da autodestruição inerente ao sistema de exploração capitalista. 
                                            
Darwin inspirou-se em Malthus para explicar a inerente competição pelos recursos escassos entre todas as espécies vivas; foi também buscar a este autor a ideia do efeito da predação (e incluindo o parasitismo) como forma de ajustar os efetivos das populações de presas e de predadores.                 
Após Darwin, o seu sobrinho Galton adaptou os conceitos de seu tio e de outros. Numa linha neomalthusiana defendeu a eugenia - ou seja - que os «melhores» deviam ser estimulados a procriar enquanto os que eram portadores de «taras» deviam ser impedidos de procriar. 

                    
Vários países praticaram a esterilização sistemática de pessoas consideradas «inferiores». Muitas pessoas têm ideia de que apenas a Alemanha de Hitler e quanto muito alguns dos seus estados-vassalos da Europa praticaram essas medidas. Hoje, sabe-se que não foi assim: Desde a Suécia à Austrália, sucedem-se histórias verídicas de políticas de Estado, da esterilização forçada de certos grupos de cidadãos.
  

A grande indústria e em particular o império Rockefeller estão associados desde o principio, ou seja, antes ainda do partido NAZI subir ao poder, através da Fundação Rockefeller, em apoio entusiástico ao eugenismo prático, além de serem financiadores de muita da investigação científica destinada a melhoramento da espécie humana. É com base em programas financiados pelos grandes empórios da agroquímica que são criados OGM, organismos geneticamente modificados. William Engdahl explica de modo muito convincente e exaustivo, no livro «As sementes da destruição»,  que a oligarquia (Rockfeller e outros bilionários) esteve - desde o princípio - a subsidiar e promover as OGM. Décadas antes (nos anos 70), defendendo uma estratégia tipicamente neo-malthusiana, o seu protegido H. Kissinger tinha já delineado uma estratégia de guerra económica utilizando sementes, trigo, soja, leite, principalmente.

                  
A utilização dos alimentos estratégicos (sobretudo dos cereais) como arma de chantagem permitiu a Washington impor aos governos de países do Terceiro Mundo, programas de «controlo da natalidade» (que incluíram esterilizações em massa e sem conhecimento/consentimento das mulheres) como condição para beneficiarem do apoio alimentar não só dos EUA, directamente, como também de agências internacionais, mas de facto controladas pelos EUA.

Actualmente, as chamadas guerras contra o terror têm uma dimensão de destruição massiva não apenas das populações como também das infraestruturas. Assim, no Afeganistão, no Iraque, na Síria, na Líbia, no Iémene, estão documentados actos destinados a destruir ou inviabilizar estruturas fundamentais para a população civil, desde centrais eléctricas e geradores de corrente, a sistemas de canalização e tratamento de água potável e de esgotos. O resultado é a morte de milhões de crianças, principalmente causada pela desnutrição, ausência de cuidados básicos de saúde, de água potável, etc. Note-se que estes países ficam com uma população reduzida, não somente porque tem de emigrar para longe, como refugiados, como também está desnutrida, enfraquecida, mais sujeita a doenças, em países devastados, onde não existem os recursos médicos e sanitários mais elementares. 
                 

Estas guerras do Império, de uma crueldade incrível, seriam suficientes, por si só, para condenar os presidentes e seus respectivos governos (George H. Bush, Bill Clinton, George W. Bush, Barack Obama e Donald Trump), se houvesse o equivalente do tribunal de Nuremberga. Infelizmente, os países que participam no tribunal da Haia, consentiram que os EUA se auto-excluíssem de poder jamais comparecer no dito cujo tribunal, apesar de terem sido os mais fervorosos impulsionadores do mesmo.
A política de destruição sistemática ocorre nos países do «crescente fértil», onde nasceu a agricultura há 12 mil anos, onde existe uma parte muito grande do petróleo explorado.

O trazer aí o caos, encorajando a intolerância religiosa, sectária e étnica, não é fruto do acaso ou daquilo que os  media corporativos nos querem fazer crer: é resultado duma política neo-malthusiana destinada a reduzir drasticamente certas populações, sobretudo,  se elas são dos países que detêm recursos (o petróleo, mas também certos minerais) de que o «Ocidente» carece para as suas indústrias, para satisfazer o seu estilo de vida e consumo.


Existe uma forte corrente que se designa de «neocon» que capturou sectores inteiros do governo dos EUA e sobretudo do chamado «Estado Profundo», incluindo as agências CIA, NSA, Homeland Security, etc. Esta corrente advoga que é possível uma guerra nuclear ser «ganha» pelos EUA, havendo depois um redistribuir de poderes e de recursos em benefício dos mesmos e de seus vassalos de «primeira» (essencialmente anglossaxónicos «de pele branca»: Grã-Bretanha, Austrália, Canadá, Nova-Zelândia).

Todos os outros países sofreriam devastações tais, que durariam muitos anos a recomporem-se. Loucamente, delirantemente, imaginam conseguir obter uma redução de 4/5 da população mundial, por este meio (o holocausto nuclear) e que as populações sobreviventes viverão em condições muito satisfatórias. Mas uma guerra nuclear significa a destruição completa da habitabilidade do planeta ou, no mínimo, a perda irreversível das condições para os sobreviventes. É este o perigo que o mundo enfrenta, se deixar um punhado de pessoas com poder (os neocons e a oligarquia mundial) manobrar as políticas dos Estados.


terça-feira, 7 de novembro de 2017

SAÚDE PÚBLICA DE CANTINAS ESCOLARES EM RISCO, NAS MÃOS DE EMPRESAS

Comunicado da FERLAP, associação de pais e encarregados de educação de alunos dos ensinos básico e secundário: 


MEU COMENTÁRIO:

O escândalo da má qualidade e mesmo do risco para a saúde das crianças portuguesas, em especial, nas cantinas escolares entregues à voracidade de empresas de prestação de serviços, no geral, muito pouco qualificadas para os ditos cujos, muitas apenas tendo obtido os contratos graças a conivências inconfessáveis com o poder autárquico e/ou com manda-chuva que pontificam em certos estabelecimentos, não poderá ser nunca resolvido, a não ser que se ponham em prática os princípios que informam ainda (legalmente) os serviços públicos e a escola pública, em particular.
Estes princípios são incompatíveis com o lucro, com a rentabilidade dos negócios acima das pessoas e portanto, a entrega de cantinas escolares a privados é necessariamente um péssimo negócio para o Estado, mas sobretudo para os utentes, os alunos principalmente.

Quando exerci o cargo de professor na Esc. Sec. de S. João do Estoril, pude constatar (e antes, também, na Esc. Sec. D. João de Castro em Lisboa e noutras escolas públicas) como era importante para a qualidade das refeições, que estas fossem elaboradas e servidas por pessoal auxiliar da própria escola. Sendo pessoal permanente, não precário, portanto vitalmente interessado em que o serviço tivesse qualidade, mesmo quando (já) não tinham seus filhos ou netos a frequentar a mesma. 
Muito menos interessados estarão funcionários de uma qualquer empresa de «catering», colocados ora num sítio ora noutro, estando o seu lugar dependente dum patrão e não dos utentes ou da direcção da escola em causa, pelo menos directamente. 
Além disso, é evidente que um serviço com preços bastante controlados, para dar lucro, terá de reduzir a qualidade da matéria-prima utilizada. 
Igualmente, quanto mais baixa a formação de seus funcionários, menos terão os patrões dessas empresas que pagar em salários, segundo contrato de trabalho do sector.

A lógica educativa e a da saúde pública não se compadecem com  a lógica empresarial.

As pessoas deviam abrir os olhos e perceber - de uma vez por todas - que a auto-gestão das cantinas escolares (e das outras também) não apenas é possível, como é também o único processo seguro, decente e sustentável. 
Isso implica que a gestão destas cantinas seja devolvida às escolas, as quais deverão considerar imperativamente todos os seus aspectos como sendo pedagogicamente relevantes, desde a escolha das matérias-primas e da confecção das refeições, até a como atender às necessidades especiais, etc.

segunda-feira, 6 de novembro de 2017

PARAÍSOS FISCAIS

Com a nova fornada de fuga de informação, dos Paradise Papers, neste caso oriunda de uma firma chamada Appleby, especializada em obter condições favoráveis para capitais em jurisdições «off-shore» em condições legais, surgem publicados na media corporativa (Süddeustche Zeitung, The Guardian, ...) nomes sonantes, desde a Rainha de Inglaterra, até Wilbur Ross, membro do gabinete de Trump que teria participação em empresas russas sujeitas a sanções, impostas unilateralmente pelo governo dos EUA.
Repete-se o mesmo processo dos Panamá Papers,  de revelações sensacionais seletivas, que permitem usar - como armas de baixa política - dados confidenciais, nem todos implicando comportamento criminal ou ilícito, longe disso. 

Ao ler as notícias vem-me a sensação de náusea: com efeito, estas injeções de informação sobre os muito ricos ou muito poderosos e as suas «escapadelas fiscais» ocorrem nos mesmos jornais que são largamente controlados pelas corporações  elas próprias partes interessadas e participantes desses mesmos «paraísos». 
Parece-me que isto tem muito mais a ver com uma operação de condicionamento psicológico do que com uma preocupação deontológica em revelar a «verdade, só a verdade e toda a verdade». 

Porque ninguém na media mainstream faz as perguntas cruciais:

Os governos e as grandes corporações reconhecem que esta gestão «off-shore» é prejudicial para a economia dos diversos países, em particular obrigando a uma punção acrescida de impostos sobre os menos ricos, os da classe trabalhadora, os quais são também os que mais produzem e cujo o nível de consumo é determinante para o funcionamento da economia.
Eles têm o poder para mudar a legislação em seus próprios países, agindo ao nível dos parlamentos e dos governos, para impedir ou restringir fortemente a colocação em «off-shore» de captais privados ou de empresas. Nada disso seria um atentado à soberania desses micro-estados, admitindo que esses tenham efetivamente uma soberania, que sejam mais do que um pavilhão de conveniência para os grandes interesses aí resguardarem os seus capitais.  

A resposta a esta «inexplicável» ineficácia dos diversos políticos e dos grandes magnates é clara: só estão interessados em termos de imagem pública, de campanha eleitoral, mas não que estes meios de fuga «legal» ao fisco dos seus próprios países sejam verdadeiramente eliminados, visto que são beneficiários diretos dos mesmos. 


                       Graphic showing who is hiding their cash


sábado, 4 de novembro de 2017

O QUE AS PALAVRAS ESCONDEM (DOS CÃES E DOS HOMENS)

Os cães não sabem fingir, ou pelo menos não fingem de forma habilidosa, sistemática e continuada. Os cães são superiores aos homens. Porque um cão é indiferente com indiferença, ou é afetuoso com afeto. Não teatraliza, não faz discurso das suas «boas acções». 
Os homens (espécie humana, entenda-se, os dois géneros e quaisquer outras identidades que quiserem), são permanentemente falsos, são incapazes de sentimentos verdadeiros, a não ser quando possuídos de intensas paixões e apenas nesses momentos. 
Fora disso, são dissimulados, hipócritas, ou cínicos. Eles podem declarar tudo  e o seu contrário, para depois fazerem exatamente como se nada tivessem dito ou prometido. 
Os homens que assim agem são muitas vezes considerados e admirados como sendo os «vencedores» e enquanto que os que têm preocupações éticas, que têm pudor e não exibem a sua insignificância... estes, têm em geral a etiqueta de «perdedores».

Esta sociedade está cheia de pessoas que espezinham os outros e de cobardes que tratam os tiranos com deferência e temor, porque reverenciam o poder. 
Esta sociedade está cheia de filhos e filhas que deixam os pais ao abandono, que querem ignorar que seus progenitores estão a passar misérias. 
Eles repudiam-nos, como se não fosse nada com eles; amanhã, se tiverem filhos, acontecerá o mesmo com eles. 

Uma sociedade assim não pode viver, pode apenas fingir que vive, porque a vida não é a satisfação da matéria, mas é antes uma expressão  do espírito cósmico. 
O fato da vida se ter amesquinhado tanto nas nossas sociedades, é sintoma de decadência. Se esta decadência é irreversível ou não; apenas o tempo (longo) o dirá. 
Mas, de facto, estamos em pleno itinerário de decadência civilizacional. 
As culturas, as civilizações, são como os frutos, começam a apodrecer por dentro. No exterior só se notam as marcas quando já a zona central (os sentimentos, as emoções, o saber emocional, o coração, o cerne) está completamente alterada.

Haverá um renovo espiritual, se a humanidade não se auto-destruir de uma das múltiplas maneiras estúpidas que ela inventou para o fazer... bombas nucleares, catástrofes climáticas, perda acelerada de fertilidade dos solos, contaminação das águas, etc. etc.
Porém, este renovo espiritual não é possível nestas situações actuais de decadência generalizada, neste ocaso civilizacional, nestes tempos realmente obscuros. 

Voltaire inventou a figura do senhor Pangloss. Um filósofo que encontrava sempre razões para otimismo, mesmo no meio das maiores desgraças. Se ele vivesse hoje teria muito maior dificuldade em criar um personagem Pangloss contemporâneo. 
As distopias de Orwell ou de Huxley não parecem tão negativas, se comparadas à  horrenda realidade que está perante nós todos. Mas só alguns conservam ainda alguma sensibilidade para compreender que estão a ser testemunhos de uma tragédia.

A humanidade está em perdição permanente e grave: um sintoma disso é a perda do sentido de empatia com quem sofre; aquilo que se chama de compaixão. 
Não existe esse sentimento tão belo e natural, que se pode ver no mundo dos animais e que até se expressa entre espécies diferentes quando uma fêmea de uma espécie adota e aleita uma cria de outra espécie. 

Muitos outros exemplos existem, no comportamento animal, que mostram claramente que eles possuem um elevado sentido moral, muito superior ao de muitos humanos, que dele têm pouco ou nada. 
Mas, os animais não falam...felizmente!
Se os animais falassem.... seriam exactamente (fora as aparências físicas, claro) como humanos. 
Sabemos isso desde os mitos, lendas e fábulas, em que animais simbólicos são postos a falar, a ter comportamentos e emoções de humanos.

quarta-feira, 1 de novembro de 2017

MARINALEDA: AUTOGESTÃO NA ANDALUZIA





Marinaleda: Autogestão na Andaluzia

Nesta sessão do dia 3 de Novembro, vamos apresentar na Fábrica de Alternativas de Algés o trabalho de José António Antunes que fez , com a Tertúlia Liberdade, uma notável reportagem, há cerca de 3 anos, sobre os movimentos sociais no campo, na Andaluzia. 
O principal protagonista desta gesta é o Sindicato de Obreros del Campo (SOC), um sindicato autogestionado e que tem baseado as suas acções em El Coronil e em Marinaleda.
Vamos portanto saber como um sindicato autogestionado, em assembleia com toda a população, pode organizar, não apenas os momentos de luta, como também a produção, os espaços de habitação e o quotidiano de milhares de pessoas.



                      

terça-feira, 31 de outubro de 2017

A QUESTÃO DO NACIONALISMO E DA «UNIÃO» EUROPEIA

                        
Há algum tempo colocava a questão se existiria um nacionalismo de esquerda. Respondi que sim, que era evidente, pelos exemplos históricos diversos. 
Agora temos um caso especial com o nacionalismo catalão e o destino incerto de uma República Catalã que foi negada, anulada, mal foi proclamada. 

A questão de fundo prende-se com a direção do movimento nacionalista, seja em que região do mundo for. Vimos isso com as direções dos movimentos de libertação das ex-colónias portuguesas, por exemplo, que assim que tiveram o poder e formaram governo nos seus países recém-chegados à independência tratarem de assegurar o controlo pessoal dos diversos sectores da economia e finalmente, acabarem por distribuir benesses e postos lucrativos a familiares e amigos, assegurando também um pecúlio suficiente para um exílio dourado, algures à beira dum lago suíço.

Na Península Ibérica, desde a Idade Média, as diferenças culturais e étnicas, inegáveis, entre povos da Hispânia ou Ibéria, vão-se repercutir na divisão entre vários reinos, historicamente o terreno onde se desenvolveram as línguas e floresceram as culturas. 
Porém, o nacionalismo surgiu - de facto - como ideologia política somente no século XIX, na sequência da convulsão das guerras napoleónicas, em toda a extensão do continente europeu. Foi a partir dessa época que o nacionalismo se afirmou como uma aliança entre a burguesia e o povo (os camponeses, os artesãos e o proletariado das nascentes indústrias).

A República Espanhola era federal e as diversas regiões, incluindo o País Basco, a Catalunha e a Galiza, tiveram órgãos próprios de governo. 
No franquismo, as reivindicações de autonomia política foram ferozmente reprimidas, enquanto se permitia a afirmação dos particularismos regionais, como expressões da «diversidade» dentro da mãe Espanha. 
O modelo republicano era federalista: tinha na sua génese as reivindicações de poderosas burguesias regionais, que desenvolveram indústrias e comércio, na Catalunha e no País Basco, sem precisar de Madrid, a sede do império. 
Está patente, sob forma de testemunhos de pedra, a ascensão da burguesia industrial em San Sebastián ou em Barcelona. No período que vai da segunda metade do século XIX, ao primeiro quartel do século XX, foram construídos muitos monumentos e prédios burgueses nas artérias mais prestigiosas destas cidades. 
A região Galega também teve o seu impulso, liderado por uma burguesia nacional, mas sob o franquismo e o imediato pós-franquismo, constituindo fortunas colossais, como a dos patrões da «Zara» ou da «Pesca Nova». O nacionalismo galego sonha com um Estado único englobando a Galiza e Portugal. 

O nacionalismo «revolucionário» está em crise, assim como as correntes de extrema esquerda autoritária, principalmente de influência maoista, que as protagonizaram. Embora só possam oferecer um pouco de ópio de ilusões emancipadoras, conservam ainda uma certa áurea nalgumas regiões, em sectores das classes trabalhadoras.

A crise catalã vem confirmar isto, pois o processo é liderado - de facto - por sectores da burguesia, que têm como objetivo a integração da Catalunha no desconcerto das nações da desUnião Europeia. 
A aposta da independência ser apoiada pelos poderes eurocráticos de Bruxelas ainda não foi considerada perdida por vários sectores pró-independência da Catalunha. 
Mas pessoalmente, eu acho que está mais que provado que os poderes de Bruxelas e da grande maioria dos Estados e Governos que compõem a manta de retalhos chamada Europa «unida», nada temem mais do que um simultâneo rebentar de crises nacionalistas nos seus respetivos Estados. Note-se que estes são quase todos multi-étnicos, como é lógico que o sejam, numa História de tantos séculos, com guerras, invasões e tratados de paz que redesenharam fronteiras nacionais, etc. 
O enfraquecimento do poderio da UE, pode ser interessante no curto prazo para os EUA, pois estes estão interessados em que seus aliados e parceiros sejam fracos, que precisem da ajuda e proteção do Império. É melhor - para o dólar - que sejam o euro e a zona euro a sofrer o maior impacto, na vindoura crise económica e financeira . No entanto, o imperialismo dos EUA precisa do imperialismo subordinado da UE; não quererá que esta UE rebente. 
Por outras palavras, sem dúvida que uma crise generalizada de nacionalismos seria o epitáfio do Euro e mesmo da UE. 
O declínio é inevitável, com ou sem crises nacionalistas. Veria afinal, estas crises, mais como consequências, do que como causas. Num contexto de abundância, de enriquecimento, os movimentos independentistas dificilmente terão adesão maioritária. Mas, agora na UE, existem zonas (regiões dentro de Estados) profundamente sinistradas, enquanto outras, não só não sofrem com isso, como estão a beneficiar. Tal é o panorama do após crise de 2008, no espaço da UE.

O apogeu da UE já ocorreu (pouco tempo após o tratado de Maastricht de 1992, na minha opinião). De então para cá, tem havido sucessivas crises e redefinições, que apenas têm acentuado a vertente centralista, deitando pela borda fora quaisquer aspetos federalistas sinceros que pudessem estar presentes nas visões de alguns «europeístas». A UE, na sua configuração geográfica, política e institucional, encarna um centralismo extremo: a concentração do poder em pouquíssimas mãos, à custa da liberdade e da democracia, como nos sonhos imperiais de Carlos Magno, Napoleão e mesmo de Hitler.  

O paradoxo é que, tanto os independentistas da Escócia, como os da Catalunha tenham como objetivo acolherem-se debaixo da «azinha» do Império com sede em Bruxelas. Esta UE sempre foi do agrado das grandes corporações  e da casta militar de alta patente, eles próprios vassalos do Império dos EUA. 

Aliás, hoje em dia está mais que provado, com inúmeros documentos, que a UE foi uma construção querida, acarinhada e desenvolvida pelos americanos e que as fantasias de que a UE pudesse, um dia, ser uma potência rival dos EUA, não passaram de um estratagema para embarcar nacionalistas e anti-imperialistas ingénuos. 
A crise dos nacionalismos situa-se, oxalá, no capítulo final da desagregação deste projeto megalómano e autoritário da UE. 
Que esta arquitetura de super-Estado, supra-nacional e dominador dos povos seja desmontado... e quanto mais depressa, melhor. Os povos não têm nada a ganhar com a sua perpetuação. 
A democracia só pode beneficiar com o desmantelamento desta capa de burocracia e de leis feitas à revelia dos povos e em contradição com as legislações nacionais. 
A UE, desde o princípio, foi a união dos cartéis das grandes indústrias. Tinha de se revestir da «etiqueta» da democracia e da fraternidade entre os povos, para fazer passar seu projecto, como sendo desígnio de todos, de todas as classes, em que todos seriam beneficiários. 

A crise económica, política e institucional na Europa, tem mostrado os aspectos menos reluzentes da ditadura da burguesia. 
Nada, na crise catalã, deveria surpreender as pessoas que compreendem a verdadeira natureza da UE e dos seus Estados membros.